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Quatro perguntas para quatro nomes do rock setentista brasileiro
O cantor e guitarrista César de Mercês foi um dos integrantes da banda O Terço nos anos 1970, época em que chegou também a lançar um disco solo com regência do maestro tropicalista Rogério Duprat. N’O Terço, cantou e tocou notas progressivas e compôs, entre outras músicas, “Hey Amigo”, um dos clássicos da banda. E agora, prepara-se para voltar à banda.
Cantor e violonista, Gerson Conrad acaba de lançar um trabalho solo, “Lago Azul”, mas foi como integrante do famoso grupo Secos & Molhados que solidificou sua carreira. É de sua autoria, por exemplo, a música feita para o poema “Rosa de Hiroshima”, fazendo dele uma canção imortalizada na voz de Ney Matogrosso.
O baixista e cantor Pedro Baldanza (ou Pedrão) já tocou com nomes célebres da nossa MPB, como Elis Regina, Sá & Garabyra e Roberto Carlos, mas sua identidade musical tem suas bases no rock progressivo. Um dos fundadores da banda O Som Nosso de Cada Dia, atualmente segue em atividade com o grupo.
Willie de Oliveira começou sua trajetória como cantor de baile, na adolescência, mas seu caminho artístico mudou de forma expressiva mais tarde. Passou pelas bandas Tutti Frutti (que acompanhou Rita Lee em shows e gravações nos anos 1970) e Rádio Táxi (nos anos 1980).
Juntos eles formam o... Quarteto Fantástico? Não exatamente. São fantásticos, sim, cada um com seus “poderes musicais”, mas compõem um outro quarteto: o grupo O Som dos 4, que está na programação do Pandemia Rock deste ano. Em entrevista a equipe de comunicação do Sesc Birigui, falaram sobre suas carreiras, o panorama do rock setentista e progressivo, entre outros assuntos.
Cezar de Mercês (O Terço)
Quais as melhores memórias que você tem de sua participação na banda O Terço?
Foram muitas e em diferentes épocas. A primeira delas foi ter sido convidado para integrar a banda em substituição ao Sergio Hinds, que logo voltou e nos tornamos um quarteto, já participando de festivais importantes. Com a saída do Jorge Amidem, passamos a ser um power trio, com uma pegada mais rock, quando gravamos o LP de 1972, com o tema “Amanhecer Total”, concebido por mim e que se dividia em subtemas, formando o que foi chamado de “Oratório Rock”. Nesse período, viajamos para a França, com o cantor e compositor Marcos Valle, e em seguida percorremos o Brasil. Depois de três anos fora da banda, voltei em 1977. Gravamos o LP “Mudança de Tempo” e participamos do 1º Concerto Latino Americano de Rock, com três apresentações no Brasil e duas na Argentina. Isso durante o regime militar vigente nos dois países. Mas entre as melhores memórias, não posso deixar de destacar a oportunidade de conhecer e trabalhar por mais de cinco anos com o maestro Rogério Duprat e ter me tornado seu amigo.
Você era baixista d’O Terço e provavelmente foi e é referência para gerações de músicos que vieram depois. E quem são os baixistas que mais lhe influenciaram, entre brasileiros e estrangeiros, sobretudo dos anos 70?
Entre os brasileiros: Jamil Joanes. Entre os estrangeiros: Chris Squire (Yes) e Greg Lake (Emerson, Lake & Palmer), por também cantar.
No ano que vem, completam-se 40 anos do lançamento de seu disco solo “Nada no Escuro”, com regência de Rogério Duprat? Como foi a experiência de trabalhar com o maestro? Duprat é conhecido por seus trabalhos tropicalistas, por atuar ao lado d’Os Mutantes e outros representantes do movimento. “Nada no Escuro” carrega algo da atmosfera tropicalista?
Além de ter o maestro como arranjador e regente no disco "Nada no Escuro", também temos uma parceria gravada no mesmo disco: "Sopro no Coração", que é uma peça curta que compus e foi redesenhada de forma magistral pelo maestro para um quarteto de saxofones. No disco não há nenhuma referência direta ao Tropicalismo, mas como o repertório é bastante variado e passa por muitas referências de MPB, o trabalho do maestro foi fundamental para dar mais "brasilidade" ao projeto como um todo.
Quais são seus projetos atuais? Você não participa das atividades atuais de O Terço?
Estou oficialmente retornando à banda, com o compromisso de, ao longo do segundo semestre desse ano, prepararmos um repertório de músicas inéditas que será material para um novo CD/DVD e shows. Neste momento, estou participando como convidado dos shows do projeto "14 Bis Acústico - 35 Anos". Já fizemos shows nas unidades do Sesc de Belo Horizonte, Ribeirão Preto e Santo André. Em julho estaremos em Goiânia e Brasília. Para São Paulo está programada a gravação de um CD/DVD. Também estou pré-produzindo o meu terceiro disco solo e me apresentando em projetos como o Som do Quatro e um trio de rock com o guitarrista Sérgio Hinds. E estou à procura de um editor para o meu livro de poesias. Conhece algum? (risos)
Gerson Conrad
Secos & Molhados foi uma banda conhecida, entre outros aspectos, pela ousadia na performance e no visual. Você enxerga referência ou algum reflexo disso na música brasileira atual? Se não, por quê? Se sim, de que forma? Citaria bandas ou artistas brasileiros que tenham se dado bem trabalhando nesta vertente?
O grupo deixou sua marca tanto em suas composições como no visual dentro do show business. Há, sem dúvidas, muita referência dentro desse cenário na música brasileira pós S&Ms. Acredito que, principalmente referente ao mercado fonográfico, uma vez que fomos um divisor de águas quando vendemos mais de 1 milhão de cópias de LPs, abrindo um horizonte até então não conhecido para essa indústria. Assim, artistas ou grupos que surgiram após 1975, certamente se beneficiaram dessa vertente. Poderia citar como exemplo, Mamonas Assassinas, RPM, entre tantos outros.
Se Secos & Molhados tivesse surgido hoje, neste Brasil do ano 2018, como acha que seria a repercussão e a recepção do público?
Secos&Molhados é referência há 45 anos, o que me faz crer que tanto a recepção, quanto a repercussão seriam a mesma¿. Há de se considerar, que surgimos em uma época em que a comunicação era mais lenta. Não dispúnhamos da velocidade da chamada "web". Fácil imaginar o que aconteceria hoje em dia.
Você está lançando o disco “Lago Azul” neste mês. O disco preserva algo da psicodelia dos anos 1970, ou viaja por uma vertente distante disso? E existem no disco referências a outros estilos musicais, certo? Quais são elas?
Sim, preserva, mas, no sentido literal do significado da palavra grega - "manifestação da alma" (psico-délen), como afirmou o psiquiatra britânico Humphry Osmond em 1957, ou, como ele dizia, o que "revela a mente". Sou um compositor eclético e me enquadro no conceito de uma música universal, sem rótulos ou regionalismos,¿ ¿apesar de meu disco ser caracterizado como pop-rock¿. É sem sombra de dúvidas um CD de muitas cores.
Como está a banda Trupi? Tem outros projetos além da carreira solo e da banda?
A Trupi está cada vez mais entrosada e afiada. No momento, preparamos o show de lançamento de “Lago Azul” e, paralelamente, uma releitura do repertório S&Ms. Outros projetos são pessoais, como arquiteto.¿
Pedro Baldanza
Como você vê o cenário do rock progressivo no Brasil hoje? Há espaços e eventos do segmento? Há bandas novas que você citaria como revelações?
Eu vejo o cenário da música progressiva se ampliando nos dias de hoje. Alguns novos espaços aparecendo, um número cada vez maior de seguidores nas mídias digitais, o que me faz acreditar que um espaço está se abrindo! Muitas bandas novas buscando essa essência do prog, entre elas, cito o Protofonia, de Brasília (DF), que faz um progressivo brasileiro da mais alta qualidade. O festival Totem Prog, que aconteceu em São Paulo no Teatro UMC na Vila Leopoldina, apresentou uma série de bandas progs de São Paulo e do Rio.
O álbum “Snegs” é considerado um dos clássicos do rock brasileiro dos anos 70. A que atribui isso?
Snegs foi o primeiro trabalho do SNCD, o nome da banda saiu de uma das músicas que eu apresentei quando decidimos, eu, Pedrinho e Manito, gravar as minhas composições! É considerado pelos críticos do progressivo como um dos marcos do estilo e eu fico muito honrado. Acredito que a maior razão disso foi a singularidade do trabalho e a boa impressão que todos que assistiram e assistem hoje sentem ... Nossa Música Progressiva Brasileira vai muito além do rock prog. Ela traz influências ilimitadas de várias tendências! Por isso talvez a empatia de todos.
O Som Nosso teve idas e vindas... Como está a última “vinda”? Quais são os projetos atuais, quem integra o grupo hoje? Planejam novo disco?
O SNCD teve, sim, algumas idas e vindas! A banda se formou no início dos anos 1970 e voltamos a nos reunir em 1994. Fizemos nosso terceiro disco, aliás, ao vivo, e depois da morte de Pedrinho Batera, só voltamos a nos reunir em 2008, por um convite da Virada Cultural de São Paulo. Depois veio o falecimento de Manito e eu resolvi parar. Mas, por insistência de muitos amigos e fãs, resolvi retomar o trabalho. Hoje tenho ao meu lado Marcelo Schevanno na guitarra, Fernando Cardoso nos teclados, Edson Gilardi na bateria e Pedro Calasso na percussão e na voz; conto também com a participação elegantíssima de Cássio Poletto no violino. Estamos começando um novo disco e em busca de espaços para apresentar essa nova formação progressiva do SNCD.
Além do Som Nosso, você tem outros projetos paralelos? Quais?
Além do Som Nosso, desenvolvo um trabalho chamado Projeto Preto Véio, com Pedro Calasso e outros músicos. Também produzi alguns novos trabalhos para a gravadora Kuarup e grupos de música progressiva, como o Protofonia de Brasília. Acredito que o rock autoral e novas manifestações progressivas merecem um espaço maior e essa busca de novos horizontes faz parte desse projeto. O interior tem uma gama imensa de admiradores desse estilo de música e fico feliz em ver novos produtores locais do interior se interessando em abraçar a causa.
Willie Oliveira
Você integrou as bandas Tutti Frutti e Rádio Táxi. Quais foram suas melhores experiências dos períodos em que trabalhou nelas?
Foram vários momentos ao lado de Rita Lee & Tutti-Frutti e depois com o Rádio Táxi, alias. Com o Radio Taxi, os maiores sucessos foram gravados por mim, são todos na minha voz. E fomos a inúmeros programas de televisão como, Globo de Ouro, Chacrinha, Fantástico... Os mais marcantes foram: “Jardins da Babilônia”, que gravei como backing vocal ao lado de Rita Lee, e o maior sucesso do Rádio Táxi, "EVA" no qual sou o cantor da versão original.
Como foi trabalhar ao lado de Rita Lee, a mais emblemática figura feminina do rock brasileiro?
Foi um aprendizado. Eu vinha de conjunto de baile e foi uma experiência nova no palco ao lado deste ícone pop brasileiro. Foram 4 anos na primeira fase e depois na produção do show “Saúde”, já com o Rádio Taxi acompanhando. Tive a oportunidade de participar no projeto “Refestança”, de Gilberto Gil e Rita Lee, e do disco e show “Babilônia”, com a Rita.
Quais são seus projetos atuais? Você não está na formação atual do Rádio Taxi?
Do Rádio Taxi, me ausentei em 1984, após gravar “Eva”, para gravar na Poligram "Sinal de Paixão", tema da novela “Livre Para Voar”. Retornei em 1994, para uma campanha política, retornei após o falecimento do idealizador do Radio Taxi, o guitarrista WanderTaffo, e estou hoje em carreira solo com um projeto solo (inédito e segredo...risos).
Fazendo uma comparação entre o trabalho que você fez nos anos 1970/80 e o que você realiza hoje, em relação a sonoridade e influências musicais, o que mudou e o que se mantém?
Penso que tudo mudou. Sonoridade e tecnologia que possibilitam, através de novos equipamentos, levar ao palco a sonoridade do estúdio, o som autêntico do CD. Pra mim, as minhas influências são de meus ídolos consagrados por muitos e quase todos internacionais, bagagem que trago de minha viagens fora do Brasil.