Postado em
Paulo Mendonça
garçom
Por favor, garçom:
– Traga-me o entardecer
Num copo comprido
Com duas pedras de gelo
cães
Quando se mergulha
Nas sombras
Se encontram as dores.
Os medos, suores
Se encontram cães
Com dentes ferozes
Mordendo a luz
Que se esconde do dia
E se perde na noite
Escura e tardia
cabeça pirada
Na minha cabeça
Deuses e demônios
Brigam por você
E a cabeça pirada
Revira como
Um estômago embrulhado
do que eu quis
Do que eu quis
Ficou um querer amargo
De alguma coisa
Que já nem sei
Uma sensação triste
De já ter visto
O que ainda vem
magia dos encontros
O novo de novo
Na magia dos encontros
Imprevistos
Truque do destino
Porta que se abre
Para o possível
O desejado
E o infindo.
velha louca 
Esse amor é uma surpresa
Uma represa a arrebentar
Uma fogueira acesa
A goles de vinho
E beijos na boca
E as molas da cama
Gritando e gritando
Como uma velha louca
Parecem dizer
Que te amo,
Te amo, te amo
o medo que tenho
Entre o que penso
E o que faço
Há o abismo
Em que se esconde
O medo que tenho
De ser o que sou
multidão
Eu sou muitos
Eu sou tantos
que a minha cabeça
se espanta
com a multidão
que habita
as fronteiras
do meu corpo
a cara do futuro
Eu vi a cara do futuro
Ele tinha as rugas do passado
E o jeito amargo
Dos desesperançados
a peça que faltava
Podendo ser
Tantas coisas
Eu escolhi
Ser a peça
Que faltava
No teu quebra-cabeças
solos lamentosos
Em todas as músicas
Que possa ouvir
O que mais gosto
Será sempre
Os solos lamentosos
Que alimentam
Minha solidão
De abandono
Nostalgia e beleza
a tua rua
A carne crua
A pele nua
Tem o endereço
Do meu desejo
E por destino
A tua rua
luz da madrugada
Procuro a luz da madrugada
E caminho sem destino
Destino dos sem caminhos:
Procurar a luz
Que vem do nada
De deuses que já partiram
Ou talvez
Sequer chegaram.
PAULO MENDONÇA é compositor, escritor, cineasta, fotógrafo e vice-presidente da Academia Brasileira de Cinema. Os textos publicados nesta seção Inéditos fazem parte do livro Pequenos Poemas Insanos, ainda não publicado.