Postado em 28/09/2018
Em sete décadas devotadas à representação, Fernanda Montenegro segue
no ofício de arrebatar plateias e grandes personalidades da cultura nacional
Nascida em 16 de outubro de 1929, no Rio de Janeiro, Fernanda Montenegro agrega 88 anos de vida a mais de 70 anos de trajetória pública. A atriz experimentou e experimenta sua versatilidade em diversas plataformas da dramaturgia, como rádio, televisão, cinema e teatro.
A ligação com os palcos é anterior ao diálogo estabelecido com amigos e colaboradores. Seu avô materno, Pedro Nieddu, fez parte da equipe de pedreiros que construiu o Theatro Municipal carioca, inaugurado em 1909. “Em 1959, na celebração do cinquentenário desse histórico teatro, estreamos o espetáculo O Mambembe”, relembra a atriz em um dos muitos flashes de memórias registradas em Fernanda Montenegro: Itinerário Fotobiográfico – lançamento das Edições Sesc São Paulo.
Sua estreia teatral se deu em Alegres Canções nas Montanhas, texto do escritor francês Julien Luchaire encenado no Teatro Copacabana, em 1950. Na ocasião, conheceu seu companheiro de vida, Fernando Torres.
Ainda na década de 1950, o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) reuniu Fernando e Fernanda, os atores Sérgio Britto e Ítalo Rossi e o diretor Gianni Ratto. Desse encontro, nasceu o Teatro dos Sete – iniciativa na qual o grupo participava da produção de todos os espetáculos – e a histórica montagem de O Mambembe (1959), ganhadora de prêmios de melhor espetáculo, diretor, cenógrafo e atriz.
Na época, Fernanda foi eleita Rainha das Atrizes pela Casa dos Artistas, também no Rio de Janeiro.
Outros sucessos fizeram parte da história do grupo, que durou seis anos e produziu 11 peças.
Em sete décadas de dedicação às artes cênicas, Fernanda Montenegro menciona que conviveu com mais de mil colegas, de diversas áreas. Do teatro, vieram parcerias recorrentes, como a de Rossi e Brito, que se tornaram grandes parceiros e amigos, e outros profissionais que ela faz questão de homenagear ao longo do livro, em especial no capítulo “Outras memórias afetivas”.
Nelson Rodrigues também contribuiu para a trajetória da atriz. Em 1961, o Teatro dos Sete produziu O Beijo no Asfalto, escrito especialmente para o grupo. O diálogo entre o dramaturgo e a intérprete durou oito meses, entre telefonemas de Fernanda e a feitura do texto. “Eu subi no meu próprio conceito quando entreguei à Fernanda O Beijo no Asfalto”, disse o escritor, em depoimento resgatado no livro, sobre a atriz.
Nos últimos anos, além de incursões pela TV e pelo cinema, levou aos palcos o monólogo Viver sem Tempos Mortos, baseado na obra de Simone de Beauvoir, uma das pensadoras mais influentes do século 20. No espetáculo dirigido por Felipe Hirsch, que já rendeu algumas temporadas desde sua estreia, em 2009, ela interpreta textos criados a partir das correspondências trocadas entre a autora francesa e o companheiro,
Jean Paul-Sartre. Fernanda relata que, no momento em que preparava o espetáculo, Fernando, seu companheiro de vida e profissão, falecia, tornando a simbologia do texto ainda mais profunda.
Recém-lançado pelas Edições Sesc São Paulo, Fernanda Montenegro: Itinerário Fotobiográfico é uma obra para quem se interessa pela cultura brasileira, pois a atriz, dama das artes cênicas, não se restringe aos palcos. Como ilustra o depoimento do diretor e cenógrafo italiano Gianni Ratto reproduzido no livro, ela é “realmente um fenômeno a ser considerado isoladamente, mais do que no contexto geral da arte teatral”.
Rico em fotos e depoimentos da atriz e de profissionais que conviveram com ela, o livro narra sua trajetória nos capítulos sobre sua infância e juventude, família, profissão e outros que gradualmente aproximam o leitor da grandeza artística e pessoal de Fernanda Montenegro, atributos percebidos como inseparáveis e expostos nas 500 páginas do volume.