Postado em 21/12/2018
NUVEM
a nuvem não tem nome
é e é
e pronto
não mais
não vence
se enlata
ou adula vigilância sanitária
é
antes de ser
foi
antes de nunca
ser
: elefante
guarda-chuva
uma guerra dos mundos
(sob o mar de Copacabana)
se destila nela mesma
e nunca batizou
vermes
larvas
nem mesmo a ferida de Ícaro
que morreu nele mesmo
como nuvem
que sempre foi a mesma
e nunca também
e nunca mais
será
não num avião
que as rebaixam
a terra
a terra de ninguém
a meros pedaços
cortados
guardados
numa janela
numa foto de www
como terras são guardadas
em gavetas de cartório
e cabem todas
as nuvens também
que não têm nome
três-por-quatro
e
já se foram
me entupiram sem licença de esperança
– é o que resta!
– a última que morre
e um tanto de outras coisas maquiadas de mentira
que a dose de veneno
mata a poucos goles
esperar esperar é uma sentinela da vida
que passa a noite
mas não dorme
– tudo sempre virá algum dia!
algum dia...
muito longe desta estrofe
e há o que esperar ainda
sempre há ainda
que no esperar console
pessoas
no mesmo lugar
a fazer
a buscar
a olhar
as mesmas coisas
não cansam
não cansam
não cansam
esse brincar de ir-não-ir
começa aqui e
do outro lado do mundo
(onde na escola
me convenceram que existe)
o fim
: no beijo com o céu
o mar cabe na maior coisa do mundo
Minha lua, hoje não passa
do reflexo do botão de minha camisa,
que copia a luz sem graça
da lâmpada fincada no telhado.
Tal noite migalho companhia.
Não há cerveja, conversa, poesia,
só o esticar sem pressa do tempo
em um tudo vazio, um hiato.
Nesta noite sem luz de cidades,
a vida se comprime a paredes.
Hoje estou amarrado em desejos,
amanhã é dia novo, me desato.
Mailson Furtado Viana é um poeta cearense, estreante
na cena literária nacional com a obra À Cidade, publicação independente com a
qual ganhou na categoria Poesia e Livro do Ano o Prêmio Jabuti de 2018.