Postado em 05/12/2020
Por Carol Ferreira*
A pandemia do Coronavírus e o distanciamento social ampliaram a utilização de ferramentas tecnológicas, seja para a participação em cursos e oficinas, fruição de atividades culturais ou interação entre as pessoas. No entanto, para muitos idosos, o mundo digital ainda era um completo desconhecido. Pensando em sanar as principais dúvidas, o Sesc Guarulhos iniciou o Conecta: educação tecnológica para idosos: um projeto de letramento digital, realizado em conjunto pelos programas Trabalho Social com Idosos (TSI) e o Espaço de Tecnologias e Artes (ETA).
Mensalmente, os educadores Bruno Fiorelli, Miguel Alonso e Rodolpho “Xto” Bertolini Junior fazem um vídeo-tutorial que é reproduzido durante o Ponto de Encontro Virtual: encontros mensais que migraram para o ambiente virtual, publicados nas redes sociais e no YouTube do Sesc Guarulhos. Para facilitar a aplicação das vídeo-aulas, os idosos também recebem tutoriais por escrito. O objetivo é incentivar e apoiar o protagonismo e a autonomia da pessoa idosa.
Em entrevista à EOnline, Marcelo El Khouri Buzato, professor livre-docente da Universidade Estadual de Campinas e coordenador do programa de pós-graduação em Linguística Aplicada do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp, falou sobre as novas competências que passaram a se tornar necessárias, tendo em vista a crescente dependência das pessoas em relação às Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), considerando três eixos: informação (“saber filtrar, selecionar e indexar aquilo que de fato é representativo, plausível e que merece tomar nossa atenção e tempo”), operação e interação.
O especialista acredita que o nível da operação, talvez, seja o que menos ofereça dificuldade prática. No entanto, explica que vê um problema na transição das interfaces de apontar e clicar (principalmente utilizadas em computadores de mesa e laptops) para as de toque e de voz. “As de toque, particularmente, trouxeram dificuldades para idosos, mesmo para os já habituados ao apontar e clicar. As de voz requerem, ainda, bastante treinamento dos programas e bastante atenção dos usuários”, aponta.
Bruno Fiorelli, educador do Espaço de Tecnologias e Artes do Sesc Guarulhos, explica que a equipe já mantinha um projeto parecido no atendimento presencial, uma espécie de plantão de dúvidas para os idosos. Para o educador, a mudança no formato tem sido empolgante, pois o trabalho era 100% presencial antes do início da quarentena. “Tive que aprender como adaptar a minha pronúncia, projeção de voz e postura diante da câmera mas, mais especialmente, o que eu mais gostei de aprender foi como ter um cuidado novo com o roteiro e com a forma de explicar as dicas, para que ficasse o mais didático possível para o maior número de pessoas, dentro desse novo formato”, aponta.
Miguel, outro educador, acredita que o processo de criação, apesar de parecido com cursos e aulas presenciais, se mostra diferente no quesito interação. “Estar com as pessoas faz toda a diferença no aprendizado, pois permite trocarmos as dúvidas e percebermos outras questões. Então, mesmo que a pesquisa seja parecida, temos que nos esforçar para pensar nas diferentes pessoas que estão do outro lado, e ter um cuidado redobrado. Esse é um aprendizado muito importante, para não criarmos um conteúdo muito distante”, detalha. “Além disso, temos nos esforçado para fazer o melhor vídeo dentro de nossas casas, sem materiais específicos, adquirindo uma aprendizagem com a experiência de filmar em casa”, completa.
"Eu tenho aprendido que temos que ter um olhar mais carinhoso para os idosos. Essas tecnologias chegaram muito rápido e não são simples de assimilar, do jeito que a gente acha. As gerações mais novas têm mais facilidade mesmo, mas são aparelhos com os quais eles têm contato desde que nasceram: se você for ver, um bebê já tem contato com um tablet. Os idosos, depois que eles já resolveram a vida inteira, vão ter que olhar para uma tela que ele pode encostar o dedo. É complicado isso!”, descreve Xto, nosso terceiro educador. Ele conta que também tem exercido a empatia. Sabendo que no futuro pode precisar de instruções desse tipo, diz que a reciprocidade, que espera ter no futuro, o anima a fazer os tutoriais.
Os três educadores se dizem felizes com o retorno positivo que têm recebido do público e que a intenção é seguir com o projeto em 2021, mesmo quando se der a reabertura da unidade, ampliando a atuação para atender quem não tem acesso a esse formato. “Poder trocar com as pessoas é uma experiência muito boa, e é o maior objetivo nosso como educadores. É uma grande alegria, por mais que aparecer na internet, às vezes, nos deixe com um pouco de vergonha”, confessa Miguel.
No entanto, Xto pondera que gostariam de ouvir mais pessoas, para poderem sanar o máximo possível de dúvidas. Além de pesquisas da equipe, os temas surgem de conversas com os participantes do grupo no Sesc Guarulhos.
Bruno reforça que esse retorno das pessoas destaca a relevância desse tipo de iniciativa. “As tecnologias não precisam assustar ou afastar pessoas idosas, elas podem fazer justamente o contrário. Através da tecnologia é possível encontrar formas de nos aproximarmos. Especialmente em tempos como esse, em que a melhor forma de cuidarmos uns dos outros é mantendo uma distância segura. Mas, para além disso, existe algo mais legal do que uma avó ensinando um neto alguma dica tecnológica que aprendeu com a gente? Nada me deixaria mais orgulhoso”.
Todos os vídeos do Conecta estão disponíveis no YouTube do Sesc Guarulhos, aqui.
*Carol Ferreira é jornalista, especialista em Marketing. Atua como Animadora Cultural no Sesc São Paulo, na unidade de Guarulhos, sendo responsável pelas linguagens de Direitos Humanos, Diversidade, Trabalho Social com Idosos, Infâncias e Juventudes.