Postado em 05/11/2012
No mundo das perfeições dos artistas de circo, o palhaço é a figura mais humana. Enquanto acrobatas, malabaristas, domadores e mágicos desafiam o corpo e a natureza, o palhaço se confunde, tropeça, cai e é engraçado. Já se perguntou por quê?
Talvez porque o palhaço revele o ridículo que todo ser humano carrega consigo, assim como a condição inexorável que todos temos de errar e de perder a qualquer momento.
Quando o palhaço aparece, rimos dos seus defeitos.
Rimos das suas gracinhas politicamente incorretas.
Rimos da sua dor.
Rimos da sua roupa.
Rimos do seu caminhar.
Rimos do seu rebolar.
Rimos das suas limitações.
Rimos da sua inconstância.
Rimos da sua esquizofrenia.
Rimos dos seus gestos agressivos.
Rimos daquele é ladrão de mulher.
Rimos de nervoso.
Rimos daquilo que não rimos em nós mesmos.
Rimos do que às vezes nem entre quatro paredes conseguimos rir.
Rimos do outro.
Rimos dos Zés, das Marias.
Rimos porque é permitido.
Rimos em uma catarse coletiva, como se por instantes esquecêssemos padrões morais e nos deixássemos levar.
Rimos da liberdade que não temos.
Rimos da ingenuidade que disfarçamos.
Rimos da melancolia que velamos.
Rimos do choro que engolimos.
Rimos do grito que sufocamos.
Rimos da libido que castramos.
Rimos do sorriso que não damos.
Rimos da delicadeza que tolhemos.
Rimos do encantamento que nos falta.
Rimos das cores que não usamos.
Rimos das músicas que não cantamos.
Rimos das mentiras que contamos.
Rimos dos erros que escondemos.
Rimos como se fosse prece.
Rimos como se agradecêssemos.
Rimos das perdas que, em vão, evitamos.
Rimos da criança que, há tempos, não somos.
Rimos do que é simples.
Rimos do que não é útil.
Rimos do que é natural.
Rimos do palhaço, como se ele não fosse um de nós.
E, como se não o fôssemos, rimos do que é genuinamente humano.