Postado em 01/01/2020
Vidas que se cruzam e nem sempre dialogam. Essa definição se ajusta muito bem à situação vivida por imigrantes nas grandes cidades, onde a rapidez e a agitação, entre outras características, contribuem para que muitas vezes essas pessoas passem despercebidas. Com o intuito de revelar essa realidade foi realizada a exposição Herança Compartilhada, em cartaz na unidade do Sesc Bom Retiro entre os meses de setembro e dezembro de 2012.
Fruto de uma parceria do Sesc, Centro Universitário Senac e o Consulado Geral dos Estados Unidos, é resultado do trabalho dos fotógrafos Marlene Bergamo e Tyrone Turner, que registraram imagens do cotidiano dos imigrantes em São Paulo e Nova York. Sob curadoria do professor de fotografia da Faculdade Senac de Comunicações e Artes, João Kulcsár, a brasileira Marlene e o norte-americano Tyrone inverteram o território e captaram a realidade imagética dessa população em cada cidade: ele no Brasil e ela nos Estados Unidos.
Para Kulcsár, o trabalho evidenciou a necessidade de um olhar mais flexível sobre as pessoas que não vivem em seus países de origem. “Serve para percebemos os estrangeiros, que muitas vezes estão invisíveis no cotidiano”, diz. “Pela beleza e estética das imagens pretendemos chamar atenção para esse assunto. Estamos em um bom momento econômico, mas, quando a situação fica ruim, eles são afetados também. O importante era que as pessoas visualizassem essa situação contemporânea.”
Os fotógrafos foram convidados considerando a premissa do projeto, a fotografia documental. Por coincidência, Turner já havia morado no Brasil entre 1998 e 2000. “Embora tivesse morado no país, não conhecia São Paulo muito bem”, explica. “Tive essa sensação ao frequentar o centro da cidade para comprar o filme em preto e branco e produtos químicos necessários para o trabalho. Parecia um abraço gigante de uma criatura urbana.”
Kulcsár relembra que ambos se destacaram pelo tratamento conferido aos retratos: “Eles demonstraram uma forma humanística de tratar do assunto, o que considero primordial, pois às vezes profissionais dominam a técnica sem se aprofundar no conteúdo”.
Retrato da diversidade
Embora se sentisse identificado com a temática da mostra, Tyrone ficou com dúvidas em relação à abordagem. “São Paulo é uma cidade tão diversificada e eu me questionava em como retratar esse aspecto. Então andei pelas ruas acompanhado por Shayane Lima, assistente de Kulcsár. Conversamos com as pessoas para ter uma ideia dos novos membros deste país em crescimento. E todos aceitaram nossas perguntas e câmeras, pareciam convidados de uma festa!”, recorda entusiasmado.
A forma de organização do espaço foi um dos pontos altos da mostra. Não havia separação ou identificação das fotografias. O público passeava pelas imagens sem saber se elas correspondiam a Nova York ou São Paulo. “Essa dinâmica ofereceu uma noção maior sobre os efeitos da globalização, mostrando que ocorre o fluxo de pessoas tanto de São Paulo para Nova York quanto o contrário”, opina a coordenadora de programação da unidade Bom Retiro, Claudia Cássia de Campos.
A fotografia documental é caracterizada por uma aproximação maior entre a lente e o fotografado, considerando a relação humana, o que possibilita a captura da essência do tema em questão. E os colaboradores trabalharam livremente. “Tyrone usou a câmera convencional”, explica Kulcsár. “Já Marlene, até pela dificuldade de fotografar em Nova York, uma vez que em certos ambientes as câmeras não são bem-vindas, teve mais liberdade usando a versão compacta ou um celular.”
A liberdade de trabalho acabou proporcionando uma grande sintonia entre os fotógrafos. “Eu e Marlene nos apropriamos da mesma linguagem, a fotografia, para comunicar o que encontramos na cultura de cada um”, completa Tyrone.
Vínculo cultural
Mostra apresenta leitura da situação dos imigrantes nas metrópoles de São Paulo e Nova York
A exposição Herança Compartilhada aconteceu entre os meses de setembro e dezembro de 2012 no espaço expositivo e vão central do Sesc Bom Retiro. O projeto surgiu em 2005, com a parceria entre o Centro Universitário Senac e o Consulado Geral dos Estados Unidos, que criaram o Centro de Estudos Brasil Estados Unidos (CEBE).
O intento é pesquisar e destacar os vínculos culturais entre os dois países. Desde então, houve três edições relacionando os dois países: em 2005, sobre a influência da cultura africana; em 2007, sobre a presença da cultura indígena; e, em 2010, sobre a imigração europeia no século 19.
A mostra recente buscou uma leitura atual da situação dos imigrantes nos centros urbanos de São Paulo e Nova York. O diferencial esteve no modo de articulação da captura das imagens. Foram escolhidos pelo professor da Faculdade Senac de Comunicação e Artes e curador da exposição, João Kulcsár, dois profissionais experientes, a fotojornalista brasileira Marlene Bergamo e o fotógrafo norte-americano Tyrone Turner, colaborador da revista National Geographic. Ambos realizaram suas ações fotográficas em terra estrangeira: Marlene em Nova York e
Turner em São Paulo.
Para a coordenadora de programação da unidade Bom Retiro, Claudia Cássia de Campos, foi de grande valor a parceria entre Sesc, Senac e Consulado dos Estados Unidos, bem como a diversidade de atividades extras oferecidas ao público. “Quem gosta de fotografia pôde participar das oficinas de pintura, seminário, saídas fotográficas e da roda especial de convivência, uma conversa informal na qual imigrantes do Peru, Congo e Cuba foram convidados para relatar suas experiências”, informa Claudia.