Postado em 01/01/2013
Abro a janela do quarto. A vista que me preenche do alto é da banca de jornal com notícias a espalhar, trânsito constante na rua de mão dupla, pinheiros circundando uma escola estadual, janelas como as minhas de prédios e outros em construção, telhados ocupando uma pequena parte da paisagem urbana do bairro da Mooca desta gigantesca São Paulo.
Escuto sons que chegam de todas as partes. Tenho comigo os do colégio que sempre me deixam curioso. Que se passa numa daquelas salas quando a algazarra parece querer expandir para todo o bairro? Que tipo de feito esportivo mereceu tanta comemoração, alegria e provocação? Que atitude foi elaborada na relação professor-aluno para que um barulho esperançoso ganhasse o ar e chegasse até os meus ouvidos?
Ao longo do ano e, sobretudo, nos dias de aula, assim desperto de sonhos e pesadelos. A motivação para descer do alto, sentir o calor das ruas e desfrutar da convivência com o outro leva, quase sempre, a espiar, olhar o dia, sentir sua temperatura, tecer expectativas. Parto em caminhada pela paisagem.
Diante de paisagens elaboradas pelo homem, eventualmente reflito sobre o que torna uma área mais adequada, que característica deve possuir um espaço para favorecer que as pessoas deem mais sentido à existência, como se forma aquilo que chamamos lugar digno de experiência humana, que lugar pode favorecer uma vivência especial, que lugar nos faz ser?
A Carta Europeia de Esporte para Todos, documento de 1975, reconhece o esporte dentro do contexto da educação permanente e do desenvolvimento cultural e procura estender os benefícios do esporte ao maior número possível de pessoas ao afirmar que o esporte deve ser para todos. O conceito Esporte para Todos explícito na Carta é de natureza global, abrangendo numerosas e variadas formas de esporte que vão desde a atividade física recreativa ao esporte de alto nível.
E sendo a prática esportiva uma atividade exercida em um lugar, fica a pergunta: que lugar uma cidade como São Paulo pode oferecer aos seus cidadãos de forma a permitir a experimentação plural e intensa para a convivência recreativa e esportiva? Que espaço oferece a possibilidade de práticas das mais diversas, o respeito à diversidade e o estímulo para que as pessoas preencham o tempo de lazer de forma criativa e repleta de significados?
Em pesquisa disponível na Rede Nossa São Paulo, IRBEM – Indicadores de Referência de Bem-estar no Município –, Pesquisa Nossa São Paulo/Ibope (Janeiro 2012), o Ibope Inteligência aponta que, da população residente na cidade de São Paulo, 56% dos entrevistados sairiam, caso possível, para habitar uma outra cidade. No que se refere às questões de lazer e modos de vida para esta mesma cidade e numa escala de 1 a 10, os entrevistados deram nota 4.3 como grau de satisfação. 9% dos entrevistados apontam grau de satisfação de 9 a 10 para o tempo disponível que possuem para o lazer, 30% avaliam com notas de 6 a 8, enquanto um imenso contingente de 60% dos entrevistados avaliam em notas de 1 a 5 a satisfação com o tempo disponível para o lazer.
Os dados revelam que precisamos melhorar. Que caminho percorrer? A recente entrevista concedida ao Caderno Aliás, OESP, 18/11/12, por Enrique Peñalosa, economista e historiador colombiano, ex-prefeito de Bogotá, é sugestiva. É ele quem diz: “Uma cidade só se faz com gente na rua (...) é preciso ter opções de lazer. É preciso ter mais e melhores centros culturais e esportivos comunitários, ciclovias, parques arborizados, ruas iluminadas (...) É preciso olhar para a cidade (...) a cidade precisa priorizar o humano, em todos os sentidos (...) Conheci uma iniciativa ótima de vocês: o Sesc, um exemplo de integração comunitária. O Sesc Pompeia é ótimo. Mas um certamente não basta. Em uma cidade do tamanho de São Paulo, é preciso ter mais de 300 Sescs”.
Pessoas ocupando as ruas, dando alma aos lugares. Uma esperança que me veio ao abrir a janela do meu quarto nesta manhã do dia 16/12/2012.
José Henrique Osoris Coelho, cientista social, é gerente adjunto da área de Desenvolvimento Físico-Esportivo do Sesc