Postado em 01/02/2013
Nascido na capital paulista no ano de 1965, Eder Chiodetto é fotógrafo, jornalista e mestre em Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). A experiência com as lentes começou na imprensa diária, no jornal Folha de S.Paulo, mas a inquietude o levou a buscar o diálogo entre imagem e palavra, contribuindo com colunas para o mesmo jornal e publicando o livro O Lugar do Escritor (Cosac Naify, 2003), um dos vencedores do Prêmio Jabuti de 2004. Com uma visão otimista e analítica da fotografia, é reconhecido por ser um pensador brasileiro dessa arte que vem conquistando cada vez mais admiradores. Fenômeno positivo, em sua opinião: “Se por um lado comentam que a fotografia se banalizou – o que eu acho tolo –, por outro vejo que aos poucos vamos criando uma alfabetização visual”.
Crítico, eu?
Penso que uma forte marca da minha personalidade seja a inquietação. Senti vontade de ser fotógrafo ao ver uma exposição do Araquém Alcântara em 1986, quando eu tinha 21 anos. Em 1991 estava no terceiro ano da faculdade de jornalismo e fui admitido na Folha de S.Paulo. Muito empolgado, fiz um bom trabalho e fui contratado. Três anos depois já estava um pouco saturado da rotina de fotografar pelas ruas e ao mesmo tempo ser solicitado para editar, já que eu palpitava em tudo. Por essa época havia uma carência de jornalistas para escre ver crônicas num espaço bacana que havia no extinto jornal Folha da Tarde e um dia apareci com um texto sobre uma contorcionista russa de um circo que passava por São Paulo. Gostaram e publicaram. Logo eu estava fotografando, editando e escrevendo. Devem ter percebido a minha tendência a workaholic e me oficializaram como editor de fotografia. Em 1996, percebi que havia um movimento diferente na fotografia brasileira, com artistas fotografando num registro que não era propriamente fotojornalismo. Fiquei danado com aquilo e fui às exposições, conversei com os poucos fotógrafos não documentaristas que conhecia e comecei a estudar, como autodidata, a história dessa arte. Em seguida comecei a escrever, sobre fotografia, no caderno Ilustrada, da Folha de S.Paulo. Desde então começaram a me chamar de crítico. Crítico, eu? Para quem tinha passado a adolescência achando a Ilustrada o máximo, de repente virar crítico, parecia magia. Saí do jornal em 2004 e depois fui chamado para ajudar a pensar o desenvolvimento do acervo de fotografias do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP). Lá fiz minha primeira curadoria (Veracidade, em 2005) para um museu e nunca mais parei.
Tenho experiência em coordenadoria editorial de livros sobre fotografia e curadoria de exposições. Até certo momento, acho que ambas as funções possuem semelhanças. Por exemplo, quando trabalho com os artistas refletindo sobre a produção deles, indicando caminhos que revelem de forma mais enho experiência em coordenadoria editorial de livros sobre fotografia e curadoria de exposições. Até certo momento, acho que ambas as funções possuem semelhanças. Por exemplo, quando trabalho com os artistas refletindo sobre a produção deles, indicando caminhos que revelem de forma mais contundente determinadas linhas de força de suas produções, e mesmo depois, na seleção final dos trabalhos.
A partir daí se o produto final for um livro ou uma mostra, os caminhos se separam. Pensar um livro me leva necessariamente a buscar uma edição e um sequenciamento de imagens que torne o produto uma espécie de viagem, com vestígios que resistam de uma página para outra, surpresas, reafirmações. O ritmo de um livro não tem nada a ver com o ritmo de uma exposição, no qual devemos refletir sobre a circulação do visitante pelo espaço como quem desenha uma coreografia. No mais há luz, há relações entre escalas imensas e ínfimas, é uma orquestração mais complexa quando comparada ao livro. Por outro lado, o livro consegue manter uma relação íntima, pela proximidade do leitor, que é quem deve ser levado em conta quando editamos.
Alfabetização do olhar
Vejo esse novíssimo panorama que faz de toda e qualquer pessoa um fotógrafo em potencial com muito apreço. Percebo que as exposições de fotografia recebem um contingente de pessoas imenso e todas se sentem muito à vontade para comentar esse ou aquele aspecto, o que não ocorre com outras linguagens, que muitas vezes intimidam os “não iniciados”.
Pesquisas recentes mostram que nos últimos quatro anos foram feitas mais fotografias que em todo o resto de sua história, desde 1839! Se por um lado comentam que a fotografia se banalizou – o que eu acho tolo –, por outro vejo que aos poucos vamos criando uma alfabetização visual. E quanto àqueles que desejam ser os profissionais da imagem, esses devem estudar, ir fundo em seus temas, buscar conexões históricas e conceituais, porque senão os amadores tomarão o seu lugar. Ou seja, acho que essa grande oferta de imagens move a sociedade por vários lados e muitas vezes positivamente.
Essa minha opinião surge muito em consequência do meu contato com o público que quer aprender sobre fotografia. Comecei a escrever sobre fotografia quando ela ainda não era um tema e nem tinha entrado pela porta da frente das grandes exposições. Hoje isso virou. Ministro palestras e aulas para um público cada vez mais interessado e bem informado. Adoro fazer visita guiada das minhas exposições. Aprendo muito com a reação do público. Em Geração 00, que fiz no Sesc Belenzinho em 2011 e que agora será editada em livro, eu me misturava com o público para ouvir os comentários. Foi uma experiência emocionante.
Desafios comuns
A literatura é tudo. É o melhor lugar para viajar, conhecer o ser humano, emocionar-se, reconhecer-se dentro da nossa vulnerabilidade. Escrever sempre foi um desafio para mim. Algo prazeroso, mas conseguido sempre a um alto custo de concentração, uma superação de limites. Parti para compor o livro O Lugar do Escritor (Cosac Naify, 2002) na vã tentativa de descobrir como os grandes escritores brasileiros resolviam tal dilema. Achava que para eles era sempre fácil escrever. Que nada. Cada um sofre a sua maneira e se permite prazeres fugazes entre um adjetivo e um substantivo.
Desafios similares aos da literatura também estão presentes no ato de fotografar. O fotógrafo deve ser um humanista. Deve ter visto, de joelhos, da luz de Rembrandt (1606-1669) à pintura orgânica de Jackson Pollock (1912-1956), se deliciado com as metáforas de Federico Fellini (1920-1993), ficado sem dormir três noites após ver um filme do Lars Von Trier. É extremamente necessário que ele pense a fotografia não como um fim, mas como um meio. E, quando estiver quente, é muito importante sentar num bar, tomar uma cerveja e observar a vida que passa pela janela como se fosse um grande filme, a divina comédia humana.
Sou muito otimista em relação aos horizontes da fotografia. Em se tratando de Brasil, nossa produção está ganhando o mundo. Em outubro de 2012, abri uma mostra de fotografia contemporânea brasileira em Tóquio, na Shiseido Gallery, a convite deles. Antes de Tóquio fiz uma grande mostra com quase 60 fotógrafos nacionais em Paris. Isso reflete o bom momento da nossa fotografia, que rapidamente está sabendo dar respostas criativas e pulsantes a esse tempo de excesso de informação e de imagens descartáveis.