Postado em 28/05/2014
Por Ricardo Lísias
Não foi só na minha família que o exercício sobre o capitalismo causou confusão. O professor foi demitido. Acho que estávamos em 1986. Os alunos tinham entre dez e doze anos. Segundo o que minha mãe conseguiu se lembrar, o professor criticou o esquema de quase todo mundo e pediu para que eles refizessem tudo. O meu, minha mãe falou rindo agora há pouco pelo telefone, ele tinha adorado.
Como é normal para uma atividade mais difícil, meus colegas de sala foram pedir ajuda para os pais e no dia seguinte havia vários tiozões engravatados na diretoria da escola perguntando se pretendiam tornar as crianças um bando de comunistas.
A preocupação do meu avô era outra. No dia seguinte ele me chamou, sentamos no sofá da sala e ouvi uma pequena aula sobre a história do Cristianismo, a reforma protestante e Martinho Lutero. Acho que ele só não falou de Max Weber por causa da minha idade. No final, copiou o meu esquema em outra folha, explicou que a família do Salim não tinha mais nenhuma loja e que o nosso dinheiro era usado para ajudar algumas obras da igreja e para que ele pudesse se dedicar integralmente à teologia.
Aceitei a explicação calado. Naquela época eu não tinha nenhum impulso para contestar o meu avô. Ao contrário, o único momento em que eu realmente gostava na igreja era quando ele subia, bem vestido e imponente, para fazer o sermão. Dava orgulho. Eu também não soube explicar onde tinha tido a ideia para o esquema. O professor havia pedido um desenho sobre o funcionamento da economia no capitalismo e fiz aquele. Como bom protestante, meu avô disse que devíamos respeitar os Estados Unidos. Não tem nada de Tio Sam: eles acolheram muitos religiosos perseguidos. Fiz que sim com o pescoço.