Postado em 27/06/2014
Como suporte único ou agregado a outros materiais, o papel ajudou a forjar a história da arte
O substantivo “papel” deriva do latim papyrus (papiro), em referência à planta da qual se extraíam as fibras para a fabricação de folhas para escrita na Antiguidade. Esse suporte vem se reinventando ao longo do tempo, mas desde o Egito antigo, de um modo ou de outro, sempre acompanhou a história da arte e da civilização.
Na visão da artista plástica ítalo-brasileira Maria Bonomi, o papel é duplo, identificando-se como superfície para a criação e inventor de processos criativos, independentemente do trabalho executado, sejam gravuras, xilogravuras, pinturas, quadrinhos ou até mesmo esculturas e instalações, pois todas começam do papel. “Desde os papiros, ele aparece impregnado com tinta ou um gesto impresso. O papel tem a missão de carregar uma imagem dentro de si, além de possuir uma fragilidade apenas aparente, porque os papiros do Egito estão lá até hoje; então, se você trata bem, ele aguenta”, observa.
Adaptando outras técnicas à xilogravura (processo de origem chinesa em que o gravador usa madeira para entalhar o desenho que será impresso no papel), a artista Vânia Mignone, que possui formação em Publicidade e Propaganda e bacharelado em Educação Artística pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), executa obras pouco ortodoxas em papel: “Gosto muito de trabalhar com papel, mas não consigo fazê-lo em papel branco/liso. Preciso usá-lo com alguma informação impressa. Para as minhas xilos, costumo utilizar as páginas dos meus livros de arte”, exemplifica.
Recorte e colagem, considerados processos quase infantis, também são usados por Vânia, que credita à multiplicidade de métodos uma das oportunidades para reinventar uma aplicação tão antiga quanto a xilogravura. “Ciente das opções, é possível escolher o seu caminho, porque não há um modo fechado. As técnicas estão todas abertas às experimentações criativas e artísticas.”
Tão longe, tão perto
A gravadora Maria Bonomi utiliza 15 xilogravuras na nova edição do projeto Vão
Entre cabos e espelhos suspensos, 15 xilogravuras inscritas em 21 quadrantes de 4 x 4 m, projetadas em papéis recicláveis e alumínio degradável, dão forma ao Circumstantiam, obra idealizada pela artista Maria Bonomi e exposta até 20 de julho no projeto Vão.
Ocupando uma das áreas de convivência da unidade Belenzinho, o projeto da artista de fala mansa e mente inquieta provoca e dá asas à imaginação de quem o observa. Para Maria, as asas poderiam ser literais, assim os frequentadores subiriam para mexer no trabalho. “Adoro quando tenho a oportunidade de ouvir o que as pessoas acharam do trabalho. O público está integrado à obra percebendo as imagens de infinitas maneiras. Se eu pudesse, colocaria escadas para as pessoas se pendurarem e tocarem a instalação, justamente para tirar a ideia de que arte é luxo. Arte é necessidade”, afirma.
Para Maria, ter a possibilidade de promover um encontro tão espontâneo entre obra e público é transformador. Todas as partes que formam Circumstantiam foram trazidas inteiras e montadas ali mesmo, com o auxílio de uma equipe técnica que levou em consideração aspectos como calcular quantos quilos por metro quadrado era possível pendurar. Outro questionamento deixado pela artista é o que fazer quando a exposição terminar. “Quando acabar será recortado e reciclado, porque as imagens nem saem daqui com esse tamanho. Na verdade, eu gostaria de fazer uma grande distribuição e cada um levaria um pedaço para casa”, sugere.