Postado em 29/07/2014
Sem medo de ser político e abordar temas que coloquem o espectador na berlinda, Jô Bilac acredita que o palco é feito de bons encontros
Pode não ser fácil aguentar a pressão de ser apontado como um dos talentos mais promissores da nova geração de dramaturgos brasileiros, mas Jô Bilac, aos 28 anos, segura, com prazer e talento, os prós e os contras do seu trabalho. A temporada de Conselho de Classe, no Sesc Belenzinho no final de 2013, reuniu grande público em todas as sessões, além de provocar o debate sobre a educação no país. Porém, seu repertório textual é complexo e variado como a própria inconstância da natureza humana, fator de inspiração para o seu teatro. “Em minhas peças os personagens carregam em si a potência de pensamentos sublimes e, ao mesmo tempo, grotescos, mistura que confere identidade a elas”, diz. Conheça o universo de Jô Bilac na entrevista a seguir.
Tudo ao mesmo tempo, mas não agora
A minha produção é muito regular. Tem época em que escrevo muito, dois a três textos por ano, mas cheguei a ficar dois anos sem escrever, dedicando-me aos estudos e viagens, trocando de formas, até para voltar renovado e redimensionado para novas experiências de trabalho. Não consigo escrever duas peças ao mesmo tempo e nem ler dois livros ao mesmo tempo. Sou muito distraído e preciso me concentrar numa coisa só.
Cada trabalho é um encontro. Penso que, em relação ao gênero, há em comum a tensão e o humor. Quanto ao conteúdo, os textos apresentam os personagens em relações ambíguas. Em minhas peças os personagens carregam em si a potência de pensamentos sublimes e, ao mesmo tempo, grotescos, mistura que confere identidade a elas.
Compartilhar é a melhor parte
Está ficando mais claro para mim que teatro é encontro. Compartilhar com os atores e diretores é a melhor parte. Uma das razões de eu não ter caminhado para o lado do romance – pois cogitei ser romancista – foi justamente perceber que no teatro, quando você acaba de escrever, está começando. É uma obra incompleta. Só podemos formar uma ideia do texto quando ele for montado. Ele precisa sofrer transformações para chegar a sua plenitude. E, nesse processo, entram o diretor, os atores e, por fim, o público. Então, são essas interferências que me interessam, porque provocam um atravessamento e me redimensionam como artista. O teatro é um lugar de transcendência e autoconhecimento. Procuro pensar no que me diz respeito, porque se não diz respeito a mim, se não me importa, é difícil que diga respeito ao outro.
Na batalha
Ser um escritor de teatro bem-sucedido é diferente de ser uma cantora pop bem-sucedida (risos). Quando vejo meus colegas dramaturgos – jovens ou mais experientes –, sei que é uma batalha e me sinto feliz de conseguir destaque e tento utilizar da melhor maneira tal espaço. A ideia é abrir espaço para mais autores e estimular o interesse do público para o teatro brasileiro.
Passei minha infância vendo teatro como entretenimento, mas quando escrevi Os Mamutes, com 18 anos, virou a chave. Uma peça bem política e agressiva – montada 10 anos depois pela Inês Viana, no Rio de Janeiro –, e com ela comecei a entender o teatro como força política e potência de comunicação. Fiquei completamente fascinado, pois o grande barato é a metafísica que a arte e, em especial, o teatro propõem. É o homem supondo o homem, supondo o imprevisível para tentar entender alguma coisa. É bonito porque as pessoas vão para lá e sabem que é uma mentira, mas o que está sendo dito é verdade. São pessoas de mentira com uma verdade absoluta quando estão em cena, o que é muito impactante e emocionante também.
“Passei minha infância vendo teatro como entretenimento, mas quando escrevi Os Mamutes, com 18 anos, virou a chave [...] Com ela comecei a entender o teatro como força política e potência de comunicação”