Postado em 30/09/2014
O paulista Aníbal Massaini estreou no cinema em 1961, trabalhando ao lado do pai, Oswaldo Massaini, na empresa Cinedistri. Entre os filmes no currículo da distribuidora está O Pagador de Promessas (1962), de Anselmo Duarte, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes. Aos 20 anos, agregou ao currículo a gerência de produção de O Santo Milagroso (1966) e, em 1968, produziu o longa-metragem Corisco, o Diabo Loiro, ambos de Carlos Coimbra. Experiente também na direção, foi diretor, produtor e roteirista do documentário Pelé Eterno (2003). Neste Encontros, Massaini fala do início da carreira, do trabalho em família e da comédia, gênero de grande sucesso no cinema brasileiro.
O pai, uma inspiração
Vou completar 69 anos de vida e digo que 70 de profissão, pois durante os nove meses em que fiquei na barriga de minha mãe só ouvia falar de cinema. Meu pai, Oswaldo Massaini, perdeu o pai aos 17 anos em um acidente de bonde. Órfão, ele teve que procurar emprego. Gostava muito de cinema e morava na Avenida Rio Branco [em São Paulo], onde já estavam sediadas distribuidoras de filmes. Então foi trabalhar na Distribuidora de Filmes Brasileiros. Depois passou pela Columbia, atuando na área de contabilidade, e foi para a Cinédia, de Adhemar Gonzaga.
Ele se tornou gerente de distribuição e promoveu os lançamentos da Cinédia. Em 1946, O Ébrio [dirigido por Gilda de Abreu e escrito por ela e seu marido Vicente Celestino] foi certamente um filme recordista de público. Em 1949, Adhemar Gonzaga desiste da atividade de distribuição e pede a Oswaldo que encerre a filial de São Paulo, mas ele se recusa a cumprir a ordem porque tem interesse de continuar na atividade. Funda a Cinedistri em 1949, mesmo ano em que foi criada a Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Produziu e distribuiu mais de 300 filmes brasileiros.
Em família
Comecei a trabalhar com 13 ou 14 anos, na Cinedistri, na área de distribuição, fazendo uma coisa chamada “livro do selo”. Naquela época, não tinha nada automatizado, então cada fatura precisava ser lançada nesse livro. Em cada fatura, constava o nome da empresa, o valor do filme, os donos… então acabei decorando os nomes dos cinemas e das empresas que eram detentoras desses cinemas.
O que mais me interessou foi o lado da produção. Meu primeiro trabalho foi no filme O Santo Milagroso. Depois se seguiram outros. Minha primeira produção é de 1968, Corisco, o Diabo Loiro. Primeira produção que eu digo é de um filme que não foi desenhado ou produzido pela Cinedistri. Prossegui produzindo filmes, que era o que eu mais gostava de fazer, o que é uma característica diferente do meu pai, que achava que a presença dele no set de filmagens atrapalhava.
Ofício de produtor
É difícil definir o que é um produtor, porque existem produtores de vários tipos. Alguns pensam que o fato de ser um investidor na produção de um filme o coloca como produtor. Existem pessoas que produziram ou coproduziram um único filme e desistiram, até que esses filmes acabam órfãos e você não sabe localizar quem é o detentor de seus direitos. No meu caso, sempre tive uma participação bastante ativa, desde a concepção do projeto. Ou seja, o desenvolvimento da ideia, do tema, possíveis protagonistas, desenvolvimento do roteiro. Acompanho tudo, desde a concepção até a finalização, passando pela edição, que é uma coisa de que eu gosto muito.
Por força desse aprendizado, também acompanho a comercialização. Acho que esse é o ponto nevrálgico do cinema brasileiro, porque muitas vezes, e ainda hoje isso acontece, os produtores têm um desejo maior de realizar os seus filmes e nem sempre pensam nas consequências dessa realização. No filme que estou fazendo sobre o meu pai, o Jean-Claude Bernardet faz essa diferenciação. Ele diz assim: “O Massaini, quando ia começar a fazer um filme, ele já sabia quando ia terminar, quando ia lançar e em que circuito ele iria exibir”. Então, os filmes já eram planejados dessa forma. Acho que o cinema brasileiro hoje padece um pouco dessa questão.
Relação com Mazzaropi
Não cheguei a trabalhar com o Mazzaropi, mas meu pai sim. Ele já tinha produzido uma dezena de filmes, quando resolveu partir para as comédias. Entendeu que precisava de um ídolo, assim como a Atlântida tinha o Oscarito. Então, ele faz uma proposta ao Mazzaropi, que era contratado da Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Acho que ele ganhava 150 contos de réis da Vera Cruz, e meu pai disse que dobraria seu salário e que fariam quatro filmes em dois anos, um a cada semestre. Com isso, contratou o Mazzaropi, que já era uma atração enorme de bilheteria, principalmente no sul do país.
Filmaram os três primeiros e, antes de começar as filmagens do quarto, Mazzaropi pediu uma licença para fazer uma turnê em cidades do interior. Aconteceu que ele percebeu, indo fazer esses três filmes no Rio de Janeiro, muitas vezes em um canto de cenário, que não precisava de todo o aparato da produtora. Pensou: “Assim também sei fazer”. Escreveu um comunicado dizendo que se considerava liberado e foi produzir os próprios filmes. Realizava um filme por ano, que era lançado no dia 25 de janeiro, aniversário da cidade, e já era uma data tradicional para o lançamento dos filmes de Mazzaropi.
Comédia brasileira
Acho que o que mudou dos tempos da chanchada e pornochanchada foi a conceituação, principalmente a conceituação crítica. O que melhorou foi o humor das pessoas na aceitação desses filmes. Porque eu não vejo que esses filmes de grande sucesso de hoje sejam melhores que as comédias daquela época. É verdade que o brasileiro tem uma predileção pela comédia, mas era uma coisa difícil antes.
Os filmes brasileiros eram chamados de “abacaxi”, não sei se pensando que eram azedos, mas, quando lançados, eram apelidados de “mais um abacaxi brasileiro”. Cada vez que vinha um filme desse gênero, havia uma prevenção, como se a comédia fosse um gênero inferior. Felizmente, hoje não é assim.
“A comercialização é o ponto nevrálgico do cinema brasileiro, porque os produtores têm um desejo maior de realizar os seus filmes, mas nem sempre pensam nas consequências dessa realização.”
O produtor de cinema Aníbal Massaini esteve presente na reunião do Conselho Editorial da Revista E no dia 15 de agosto de 2014