Postado em 31/10/2014
No último dia do Seminário Internacional Alimentação Hoje - Entre Carências e Excessos, no Sesc Belenzinho, Elisabetta Recine e Sophie Deram fizeram palestra sobre os desafios de educação para a segurança alimentar e nutricional
A palestra “Educação para Comer?” foi conduzida por Elisabetta Recine, coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição, e por Sophie Deram, nutricionista no Ambulatório de Obesidade Infantil do Hospital das Clínicas e no Ambulatório de Transtornos Alimentares da Faculdade de Medicina - USP.
Elisabetta focou nos porquês de se desenvolver uma política em torno da Segurança Alimentar e Nutricional. Para ela, o grande objetivo de uma política deste quilate é se realizar, praticamente, na relação de um profissional com um sujeito. Comer, hoje, possui uma estrutura tão complexa, que nos afastou da alimentação – temos muito pouco ou quase nenhum controle sobre os processos que trazem o alimento à nossa mesa.
“O que é produzido? Como é produzido? Como chega à nossa mesa?”. Isso tudo se trata de questão importante para soberania alimentar. A autonomia de escolha deve ser reforçada através de um modelo de sistema alimentar circular e não linear, como acontece hoje na grande maioria das cidades.
Voltar a cozinhar é extremamente necessário para reestabelecer a proximidade do homem com o alimento, abrindo caminho para a educação alimentar e nutricional.
A fala de Elisabetta também apontou a importância de se redistribuir o trabalho doméstico. A partir do momento em que a mulher se insere de uma forma diferente no mercado de trabalho e não há uma redistribuição do trabalho doméstico, quem sofre é a ponta do processo de alimentação, ou seja, quem consome o alimento convenientemente processado para salvar tempo na rotina alucinante da casa.
É importante a mobilização das pessoas no sentido de pressionar o poder público para regular as dinâmicas da alimentação – algo um tanto próximo do trabalho do IDEC e do Instituto Alana no que diz respeito ao olhar para a rotulagem dos produtos e para a publicidade na alimentação, pontuadas no dia 29/10.
Para Elisabetta, uma política pública voltada para a segurança alimentar e nutricional deve atuar nos determinantes estruturais do sistema alimentar: o que está disponível (físico), custo (econômico), regras/regulação (político), valores e atitudes(sócio-culturais).
Olhar além das questões de consumo e escolha, mostrando o que está por trás do alimento. Isso propicia autonomia, gerando práticas críticas em relação à alimentação. As pessoas precisam ser curiosas sobre isso, precisam entender o que vem acoplado às conveniências da alimentação nestes dias.
Elisabetta Recine. Foto: Michele Mifano.
A consciência sobre alimentação permeou a fala de Sophie Deram, principalmente nos termos de se olhar criticamente para o sobrepeso e a obesidade.
Foi curioso olhar para a definição de saúde da OMS e constatar que não há menção ao peso - “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”. Para Sophie, estamos aterrorizando adultos e crianças com a balança e não se trata de combater o sobrepeso, uma vez que “combate” é uma palavra muito forte. Trata-se de equilibrar peso.
Para tanto, Sophie foi enfática “Diga não à dieta. Coma alimentos verdadeiros. Cozinhe!”. Fazer dieta desregula seu cérebro e omite outros fatores que têm a ver com o peso, uma vez que este não é só consequência do que você come, ou só da qualidade da comida que se come, mas sim de uma cadeia mais complexa que ingestão e gasto de energia. Tem a ver com seu estilo de vida, seu meio ambiente, seus humores, o estresse cotidiano – enfim, um balanço entre dieta e saciedade.
Oficina PANCS, Plantas alimentícias não convencionais encontradas no espaço urbano. Foto: Michele Mifano
Na parte da tarde, ainda houve oficinas e visita ao Mesa Brasil nas unidades de Itaquera e Carmo do Sesc em São Paulo. Ao final, a sensação de que a alimentação é, ao mesmo tempo, flagelo e recompensa, e que um entendimento maior sobre as escolhas políticas de toda a cadeia que existe entre você e o seu alimento implicam num dos dilemas mais instigantes e antigos da humanidade. Buscar informações sobre sua dieta e reconstruir uma relação de proximidade com o fazer do seu alimento é mais que necessário. É urgente.