Postado em 07/01/2015
Por: CARLA CAMARGO
As exportações brasileiras, que somaram em 2013 exatos US$ 242,2 bilhões, resultado 1% inferior ao de 2012, pode ter encerrado 2014 com uma pequena baixa. Ou, conforme previsões do Banco Central, com um pequeno superávit de US$ 3 bilhões. Até novembro passado, o acumulado do ano (janeiro a novembro) foi de US$ 207,61 bilhões com importações de US$ 211,83 bilhões. As vendas externas do Brasil, entretanto, além do fator Argentina, grande comprador de nossos produtos e cuja economia anda mal das pernas, dificultando o incremento das compras feitas aqui (as importações de produtos brasileiros amargaram uma queda de 27% naquele período), continuam dependendo das commodities, como minério de ferro e produtos agrícolas, para sustentar o perseguido saldo das transações internacionais. Em 2013, assim como em anos anteriores, esses itens, de baixo valor agregado, representaram boa parte da pauta de vendas feitas para outros mercados. Os chamados produtos básicos e semimanufaturados, como aço, açúcar, carne, petróleo e soja, para citar apenas alguns, foram responsáveis, assim como em 2013, por uma gorda fatia das exportações. O restante coube a itens industrializados como, por exemplo, automóveis, etanol, óleos combustíveis e tratores.
Mais uma vez os chineses responderam pela aquisição de boa parte dos itens negociados com o exterior pelo Brasil, principalmente os de origem agrícola. Entre janeiro e novembro de 2014, a China comprou US$ 38,5 bilhões em produtos brasileiros, seguida pelos Estados Unidos (US$ 24,7 bilhões), pela Argentina (US$ 13,3 bilhões), pelos Países Baixos (US$ 12,3 bilhões) e pela Alemanha (US$ 6,1 bilhões), segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Os maiores exportadores para o Brasil no período foram a China (US$ 34,6 bilhões), os Estados Unidos (US$ 32,7 bilhões), a Argentina (US$ 13,1 bilhões), a Alemanha (US$ 12,9 bilhões) e a Nigéria (US$ 8,5 bilhões).
A Argentina, maior parceiro do Brasil no Mercosul, é responsável pela aquisição de volume considerável dos manufaturados que colocamos lá fora, como autopeças e automóveis. Com a retração da economia portenha, todavia, as exportações daqueles itens sofreram uma queda ao longo de 2014. Entre janeiro e agosto, houve uma diminuição de 28,4% nos valores negociados com o estrangeiro. O baixo desempenho do segmento, devido justamente ao recuo das vendas para os hermanos, deve puxar para baixo a balança comercial brasileira de bens automotivos.
Se já não bastasse o exercício passado ter se revelado um ano ruim para as exportações, as projeções para 2015, da mesma forma, não trilham um percurso positivo. Como as nossas vendas internacionais são bastante dependentes das commodities, a queda dos preços desses itens no estrangeiro podem fazer estragos no desempenho da nossa balança comercial. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), que realiza pesquisas mensais sobre a produção de soja, houve uma retração, entre janeiro e agosto de 2014, de US$ 6 bilhões nas exportações do grão e de seu farelo. Em 2013, no entanto, o desempenho internacional de produtos do agronegócio, inclusive da soja, foi animador.
Números da Secretaria de Relações Internacionais (SRI) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) mostram que o agronegócio comerciou lá fora, em 2013, a soma de US$ 99,97 bilhões, cerca de 4,3% mais em comparação com 2012. A soja continuou sendo, dentro do agronegócio, a principal responsável por esse resultado – o produto participou com 31% do total das vendas para outros mercados, somando cerca de US$ 22,8 bilhões. Segundo o MDIC, os preços de algumas commodities caíram a patamares inferiores aos valores de 2013, casos do milho (-21,3%), do minério de ferro (-21%) e mesmo da soja (-4,4%).
Competitividade
Em 2013, assim como em anos anteriores, metade da soja produzida no país foi exportada. As vendas de milho também obtiveram um bom desempenho, tendo somado no período embarques de US$ 6,25 bilhões. Da mesma maneira, a carne se destacou naquele ano, principalmente a de origem bovina, registrando vendas internacionais de US$ 6,6 bilhões. No total, a venda de carnes em geral, que compreende também o frango, festejou um aumento de 6,8% no período em relação a 2012, totalizando US$ 15,7 bilhões. A China, que cresceu 7,7% em 2013, e repetindo o resultado do ano anterior, é atualmente o maior importador de produtos do agronegócio brasileiro. Como cada vez mais chineses estão consumindo devido, em especial, à expansão da economia, a grande nação da Ásia necessita vorazmente de alimentos. A China comprou o equivalente a US$ 22,8 bilhões do agronegócio brasileiro em 2013, ocupando o primeiro lugar entre os países com os quais o Brasil faz esse tipo de comércio.
De acordo com economistas e analistas do setor, era esperado para 2014 um recuo de 5% a 6% nas vendas externas do agronegócio. “Mesmo assim, é importante lembrar que menores receitas com as exportações não significam que o agribusiness vai mal. A questão é que na balança comercial cada dólar é conquistado duramente, por isso não será fácil encontrar uma solução criativa para repor as perdas”, diz André Nassar, diretor da Agroicone, empresa especializada na análise econômica e estrutural do agronegócio global.
O faturamento alcançado com as vendas internacionais do agronegócio em agosto de 2014, da ordem de US$ 8,89 bilhões, já haviam recuado 12,5% em relação ao mesmo período de 2013, de acordo com dados oficiais do governo. As receitas com a soja sofreram uma queda de cerca de 14% – outros itens tiveram desempenho ainda pior, casos dos produtos do segmento sucroalcooleiro, com um recuo de 41%, e do milho, com queda de 33%. Uma das principais explicações para essa situação é o fato da ocorrência de uma superabundância na oferta desses produtos no mercado internacional graças ao incremento da safra em alguns países produtores.
O setor de celulose, papel e madeira, entretanto, se manteve com saldo positivo, tendo alcançado entre janeiro e agosto passado, uma expansão de quase 3% nas exportações. O café, que também ocupa lugar representativo na pauta do comércio internacional, foi outro produto que obteve bons resultados, com vendas externas que avançaram 14,8% nos primeiros oito meses do ano passado. A expectativa é que o país tenha embarcado 36 milhões de sacas do grão em 2014 (4 milhões mais que em 2013), ano que se caracterizou por uma sentida estiagem por conta de uma falta de chuva como poucas vezes se viu. Trata-se de um número excelente, considerando que até então o recorde de embarque pertencia a 2011 com a exportação de 33,8 milhões de sacas. A Rússia tem contribuído com a euforia do setor, nação que recorreu aos fornecedores brasileiros tão logo passou a sentir os efeitos da sanção econômica imposta pela União Europeia e os Estados Unidos por causa da ingerência de Moscou nos problemas internos da Ucrânia. O Brasil é o maior produtor e exportador de café e o segundo maior consumidor. No ano passado a produção brasileira do grão cravou em 2,7 milhões de toneladas, ou 45,5 milhões de sacas, 3,65 milhões de sacas menos que em 2013.
A verdade é que, conforme dizem os analistas do setor, o Brasil precisa ganhar competitividade para exportar, principalmente produtos de maior valor agregado, e desse modo, ter sua balança comercial menos afetada pelas oscilações dos preços das commodities no plano externo. Segundo o Banco Mundial (BM), os gargalos de infraestrutura, entre eles a precariedade do sistema interno de transportes, dos portos e dos aeroportos, prejudicam o setor e influenciam no custo final dos produtos. O BM salienta que o Brasil se beneficiou, entre 2000 e 2010, da maior procura internacional por alimentos e minérios. Naquele período, as exportações brasileiras cresceram cerca de 262%, segundo o mesmo estudo. “Se não fosse essa procura maior por itens de primeira necessidade, o país poderia estar pior no seu comércio internacional”, observa Otávio Canuto, economista do Banco Mundial. Ao mesmo tempo outras nações emergentes como a África do Sul, China, Índia e Rússia expandiram suas vendas externas em mais de 400% naquele espaço de tempo.
Reformas estruturais
Um dos maiores desafios do Brasil é aumentar a produção e a exportação de produtos de alta tecnologia, que impactam positivamente a balança comercial porque são comercializados a preços mais elevados. Nesse campo, o país vem perdendo espaço para outros emergentes como a Índia, por exemplo. A venda para o exterior desses bens, que em 2000 representou 10% do volume exportado, caiu para 5% em 2010. “Precisamos de mais empresas como a Embraer, que oferece produtos de elevada qualidade e está bem inserida no mercado mundial”, ressalta Canuto. Enquanto a pauta de exportação não contar com outros itens de peso, o Brasil continuará dependendo essencialmente das commodities, que respondem por cerca de 62,5% das vendas externas.
Segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o país ocupa o 28º lugar no ranking internacional dos países exportadores de produtos manufaturados. “A Coreia do Sul está na 5ª posição, mas o Produto Interno Bruto (PIB) do país é 50% inferior ao nosso. E nossa população é quatro vezes maior do que a coreana”, observa José Augusto de Castro, presidente da AEB. Os altos custos tributários no Brasil para a produção industrial e a falta de uma política mais consistente para a inovação estariam entre os principais fatores que explicam a tímida presença de nossos produtos no cenário internacional. “São necessárias reformas estruturais, como a tributária, para ajudar a mudar esse quadro”, frisa Castro.
No Brasil, um grupo de cerca de 500 empresas, que integram o time das mais produtivas, respondem por mais da metade das exportações do país. Entre elas despontam algumas que vêm se firmando como exemplos de excelência no campo empresarial. É o caso da Marcopolo, fabricante e encarroçadora de ônibus localizada no município gaúcho de Caxias do Sul. A empresa, que começou décadas atrás como uma pequena oficina mecânica, se aninha hoje entre as maiores do setor em escala mundial. Em 2013, sua receita chegou a US$ 1,15 bilhão. A trajetória internacional da Marcopolo teve início na década de 1990, com a abertura de uma filial em Portugal de olho no mercado europeu – atualmente, a empresa tem bases em países como África do Sul, Colômbia, Egito e Índia, e vende para mais de cem nações. A Tecsis, fabricante de estruturas para turbinas eólicas situada em Sorocaba, no interior de São Paulo, também se destaca como uma empresa brasileira produtora de itens manufaturados que fazem sucesso no exterior. Ela tem entre seus clientes grandes multinacionais como Siemens e GE. Hoje, cerca de 70% de sua produção é exportada. Muitas estruturas fabricadas pela Tecsis são feitas sob medida para cada cliente, o que lhe confere um lugar especial entre os fabricantes mundiais do ramo. Cerca de 10% de todas as pás de turbinas eólicas produzidas no planeta são feitas pela Tecsis.
Empresas como a Marcopolo e a Tecsis, todavia, não são regra no Brasil. De acordo com um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o país ocupa o 33º lugar no ranking dos países com maior inserção na cadeia de produção global. Nações como Bélgica, Coreia do Sul, Irlanda e Singapura, grandes exportadoras de bens de alto valor agregado, estão entre as primeiras colocadas. Para fabricar mais itens de alto valor agregado, aumentar os valores gerados pelas exportações e produzir mais riqueza, está claro, o Brasil não pode se contentar em continuar baseando suas exportações em commodities, segundo análise de especialistas. “Boa parte do crescimento econômico de uma nação se deve a investimentos em pesquisas, inovação e incentivo ao aumento da produtividade, fatores que impulsionam a fabricação de itens industrializados capazes de alcançar preços de maior valor no mercado internacional”, destaca Andrew Guinn, economista da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, especializado em globalização e competitividade. “Foi o que fizeram países como a Coreia do Sul e é isso que o Brasil deve buscar para alcançar novos patamares de crescimento”, sugere.
Há sessenta anos, o país asiático era listado entre os mais pobres do planeta. Essencialmente agrícola, com infraestrutura praticamente inexistente, poucos recursos naturais, povo sem instrução e taxa de desemprego de 25% da população em idade de trabalho, tinha uma renda per capita anual de menos de US$ 100. Pois a economia precária de ontem, graças, no início, à ajuda americana e à mentalidade desenvolvimentista que passou a balizar os passos do governo local, a Coreia do Sul transformou-se numa das nações mais ricas e igualitárias do planeta, com renda per capita superior US$ 25 mil. Hoje a nação que impera na produção de navios, por exemplo, é sede de grandes grupos multinacionais e fabricante de produtos de alta tecnologia.
O voo da Embraer
Privatizada em 1994 e localizada em São José dos Campos, no interior de São Paulo, a Embraer não ocupa a terceira posição no ranking dos maiores produtores mundiais de aviões por mero acaso. A evolução da empresa, iniciada há pelo menos 20 anos com investimentos privados, contribuiu para fomentar um polo de criação de alta tecnologia no Vale do Paraíba, região onde fica parte de suas instalações. Em média, 40% das exportações brasileiras de itens de alta tecnologia saem de São José dos Campos e de seu entorno. Estão instaladas ali cerca de cem empresas do setor aeroespacial, muitas delas fornecedoras da própria Embraer, além de mais de 25 startups, boa parte delas fundada por estudantes do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), daquela cidade.
Os aviões fabricados pela Embraer, entre eles jatos executivos como o Legacy, além de aviões comerciais de mais de cem assentos, respondem por cerca de 2% da pauta de exportações brasileiras. Cada aeronave comercial fabricada pela empresa – e vendida para companhias aéreas como a American Airlines – custa em média US$ 32 milhões.
A empresa já produziu mais de 5 mil aviões que foram vendidos para mais de 80 países. Em 2014, a Embraer previa que se tornaria a segunda maior produtora do mundo de aviões executivos, segmento em que vem investindo pesado nos últimos anos. O maior produtor de aviões dessa classe no mundo são os Estados Unidos – até 2013, seguido pelo México e depois pelo Brasil. “Este ano provavelmente o Brasil vai passar o México”, afirmou Marco Túlio Pellegrini, diretor executivo da divisão de jatos executivos da Embraer em coletiva realizada em agosto de 2014. No ano passado, a companhia fechou contratos internacionais com importantes companhias áreas como a Fuji Dream Airlines, do Japão, a Royal Air Maroc, do Marrocos, e a Azerbaijan Airlines, do Azerbaijão. Para essas empresas, a Embraer em geral vende aviões especiais com capacidade para voos de longa distância. O plano é fornecer para a Fuji Airlines três aeronaves num valor estimado de US$ 258,6 milhões. A Royal Air Maroc, por sua vez, anunciou que pretende renovar sua frota de aviões com diversos modelos produzidos pela Embraer para operar, principalmente, voos em rotas europeias e no oeste da África. Nos próximos dez anos, o mercado mundial de aviação executiva deverá movimentar cerca de US$ 265 bilhões, segundo estimativas da própria empresa, com a produção e venda de mais de 9 mil aviões.
Em 2013, a Embraer atingiu todas as suas metas, com entregas de aeronaves, receitas, custos e lucro. A expectativa para 2014 era atingir uma receita líquida de cerca de US$ 6 bilhões, impulsionada pela fabricação e venda de mais de 120 aeronaves de aviação comercial e cerca de 90 jatos menores, para aviação executiva.