Postado em 27/01/2015
Professor de Psicologia do Esporte na Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), Hermes Balbino não foi sempre um acadêmico. Entre 1989 e 1999, atuou como preparador físico da seleção brasileira de basquete feminino e, atualmente, é psicólogo de apoio das seleções femininas da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV). Com graduação em Educação Física e Psicologia pela Unimep, enveredou na carreira acadêmica para se conectar com a pedagogia do esporte, cursando mestrado e doutorado em Ciência do Esporte, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Em março, Hermes lança o livro Inteligências Múltiplas, pelas Edições Sesc. A seguir, os melhores trechos do depoimento do pesquisador, no qual ele fala sobre os desafios do esporte e o papel da psicologia no tratamento de atletas.
Desde muito cedo
Pela minha trajetória dentro do esporte, venho de um lugar esportivo muito interessante. Quando eu era jovem, participava de uma obra social do Salesianos, chamada Oratório. A gente vai lá para passar o dia e aprender coisas da vida com os padres e jogar bastante futebol, entre outras coisas. Aprendi muito naquele ambiente sobre como lidar com desafios dentro de uma esfera esportiva e sobre como aquelas coisas poderiam me servir para a vida.
A gente jogava futebol com a turma e quem ganhava recebia chocolates. Quem perdia, ganhava algum dos prêmios que tínhamos lá. Sempre no fechamento, a pessoa responsável fazia uma leitura dos acontecimentos durante os jogos e como a gente poderia aprender com aquilo para a vida. Então, tenho uma percepção de esporte desde muito cedo, na visão do esporte educacional. Acredito que o esporte educa.
Esporte: uma profissão
Com o tempo, dentro da esfera esportiva, fui percebendo como provocar estímulos em quem ainda está aprendendo o jogo, mas pretende levar aquilo de forma profissional. O esporte como uma maneira de as pessoas ganharem a vida, de terem retorno profissional com a prática esportiva. Vi muitos atletas que tinham potencial, mas não conseguiram concretizar seus sonhos dentro do esporte. E outras pessoas que conseguiram fazer isso muito bem.
Isso me levou para a psicologia. Buscar entender as pessoas numa esfera à parte, para além da pedagogia do esporte, pela visão da psicologia, uma visão clínica mesmo. A minha ideia é essa: o esporte educando e as pessoas de apoio oferecendo ajuda para que esses atletas possam fazer o que gostam de uma maneira muito bem-feita.
Bola na cesta
O basquete foi idealizado para ser um jogo muito emocionante. O James Naismith [inventor do basquete] tinha um propósito muito pontual, que era tornar o basquete um jogo para a pessoa aprender para a vida. O outro desenho do basquete foi com o tempo. A gente foi percebendo a evolução das regras do jogo. Elas são para que o jogo e seu final sejam cada vez mais imprevisíveis.
Para a gente é gostoso, mas para quem está jogando não é tão simples assim. O basquete me despertou isso. Como eu poderia ajudar aquelas pessoas a entenderem e perceberem o tempo de forma diferenciada? Fiz várias leituras e estudos e ajudei a Seleção Feminina de Basquete por 11 anos. Depois, resolvi perseguir a carreira acadêmica. Fiz mestrado e doutorado e me deparei com uma teoria da Psicologia, que é a das inteligências múltiplas. O Sesc Verão, inclusive, trabalhou com essa ideia em 2009.
Então, eu trouxe isso para dentro da esfera organizacional do treino, fazendo a gestão da pedagogia do treino. Algumas coisas para mim se desmistificaram nesse espaço. Quando eu era um torcedor do jogo esportivo, achava que as pessoas que estavam jogando eram intocáveis, deuses, perfeitos. Quando entro para ser gestor do treino, percebo o quanto eles são seres humanos. Essas pessoas merecem um apoio muito forte, porque são altamente exigidas e constantemente cobradas de resultados. Às vezes muito mais do que o desempenho possa projetar.
Psicologia como aliada
A gente tem algumas frentes de trabalho. Eu gosto muito de trabalhar com os técnicos esportivos. Eles também são pessoas que são pressionadas por resultados, que têm uma projeção de resultados, do desempenho da equipe, um desenho imaginativo de como uma equipe deve jogar. Isso está na imagem mental deles, mas com certeza não está na imagem mental de quem está treinando com eles. Costumo aproximar o sonho do técnico do sonho do jogador. Existe um tratamento no processo de comunicação muito intenso. A gente percebe os resultados quando a comunicação entre as duas esferas melhora: de quem joga e de quem está ensinando o jogo, treinando as pessoas.
O outro ponto é ajudá-los a trabalhar pontos que muitas vezes são impeditivos do desempenho. Essas pessoas lidam constantemente com o medo, com a ansiedade, com alguns outros sentimentos e emoções que são despertados pelo jogo e pelo desenho do jogo. A gente tem uma atuação direta, uma clínica para o esporte. E uma outra dimensão é fazer o que muitos chamam de coaching. A ideia vem do próprio técnico esportivo, mas orientamos técnicos e atletas para atingir objetivos, pois muitas vezes eles têm objetivos muito amplos.
“Costumo aproximar o sonho do técnico do sonho do jogador. Existe um tratamento no processo de comunicação muito intenso. A gente percebe os resultados quando a comunicação entre as duas esferas melhora.”
O professor Hermes Balbino esteve presente na reunião do Conselho Editorial da Revista E no dia 4 de dezembro de 2014