Postado em 11/05/2015
Durante os meses de fevereiro, março e abril aconteceram diversas atividades dentro do projeto Mulheres em Cartaz que abordaram o protagonismo feminino em diferentes áreas culturais, com destaque para as artes visuais, tradição oral, literatura, moda, ciências, tecnologia e saúde.
Pesquisadoras, artistas, ceramistas, designers, quadrinistas, gamers, escritoras e muitas outras mulheres passaram pelo Sesc Belenzinho e ministraram oficinas, cursos e debates que provocaram e instigaram os participantes.
Em março a atividade Feminino ao Quadrado convidou Carol Rossetti, Elisa França e Sirlanney para um ateliê aberto onde contaram um pouco sobre sua trajetória e mostram seus processos de criação. De fevereiro à abril, a oficina Desenho com modelo-vivo: Outros corpos, outras belezas, trabalhou o desenho de figura humana a partir de modelos femininos usualmente considerados fora do padrão convencional de beleza.
O Café Tecnológico: A Construção da Personagem Feminina nos Games, trouxe pra conversa Maria Goretti Pedroso e Renata Gomes com a mediação de Artur Palma Mungioli. No bate-papo, foi discutido como as personagens femininas são desenhadas em videogames e, consequentemente, sua responsabilidade social nestas construções. Ainda sobre tecnologia, aconteceram as oficinas: Ciberfeminismo com Nina Gazire que trouxe a relação entre tecnologia e feminismo. Também alguns relatos com Think Olga sobre a campanha Chega de Fiu-Fiu, com Juliana de Faria.
O Coletivo PI ministrou também alguns encontros para a intervenção Entre Saltos. A intervenção urbana foi vencedora do Prêmio Funarte Mulheres nas Artes Visuais 2013. A ação se deu em forma de um desfile público onde mulheres vestidas de vermelho levam um salto alto nos pés e outro na mão, questionando a feminilidade da mulher moderna.
Seminário Mulheres em Cartaz
A programação encerrou nos dias 28 e 29 de abril com o Seminário Mulheres em Cartaz composto de 4 mesas e diversas convidadas. Elas trouxeram algumas inquietações e dados alarmantes sobre assuntos diversos. Abaixo separamos alguns temas abordados e falas das convidadas que compuseram as mesas.
Mesa 1 | O Contorno das Letras
Com Veronica Stigger, Bruna Beber e Cidinha da Silva e Mediação de Bel Santos Mayer
Foto: Renata Dantas
Nessa mesa, as participantes discutiram a representação e a participação das mulheres na literatura.
Confira algumas falas das participantes, de quando questionadas pela plateia sobre a inserção das mulheres no mercado editorial:
"Pelos prêmios de literatura, já dá pra ter uma ideia de como funciona o mercado editorial. Eu não tive dificuldades de me inserir no mercado por ser mulher, mas tenho a impressão que há sempre uma escolha óbvia e natural pelo homem. A Flip já acontece há 12 anos e só teve uma mulher homenageada até agora.”
Verônica Stigger
"Quando eu publiquei não tinham muitas mulheres publicando livros. Eu vejo pela minha editora lá do RJ que eles não publicam muitos livros de poesia, e dentre 200 mil livros, talvez apenas 3 sejam de mulheres."
Bruna Beber
"Teremos espaço no mercado, de acordo com o que tiver em voga no momento. Há uma dicção diferente sim entre mulheres, pelo contexto social, racial que nos informa. Infelizmente existe um estereótipo de perfil único feminino.”
Cidinha da Silva
Bel Mayer mediadora da mesa, já no final levantou a pergunta: “O que vocês consideram importante abordarem na literatura infantil? O que vocês elegeriam para as crianças pequenas?”
“Acredito ser importante mostrar nessa literatura infantil, que gênero é construção. Não tratar tão separado como homem e mulher, mas sim incluir diversas sexualidades e de forma natural.”
Verônica S.
“A gente sempre pensa na literatura infantil com uma funcionalidade. A mim interessa sempre coisas que não sejam didáticas. Tratar de todo e qualquer tema. Violência sexual, temas por mais duros e ásperos que pareçam. Eu posso falar de qualquer tema, mas com leveza, e esse é o desafio.”
Cidinha
Mesa 2 | Trabalho e Educação
Com Cida Bento, Andrea Boreli e Zilda Marcia Grícoli Iokoi. Mediação: Renata Felinto
Foto: Renata Dantas
A população feminina representa 70% da população mais pobre do mundo, ao mesmo tempo que integra grande parte da mão-de-obra. São detentoras de apenas 1% da riqueza mundial. As mulheres ainda recebem cerca de 60% dos salários médios dos homens com igual escolaridade. Fala-se, a exemplo, que os homens dominam as ciências exatas, mas as estatísticas apontam que eles recebem maiores salários e posições em todas as áreas, inclusive aquelas consideradas majoritariamente femininas. A mesa teve como objetivo apresentar algumas dessas questões e possíveis caminhos a seguir.
"As mulheres estão inseridas mas não conseguem ascender."
"O cabelo, a roupa, tudo influi hoje em você conseguir ou não um emprego. Uma aluna minha, negra, tinha algumas dificuldades para encontrar e não entendia o por que, já que ela tinha inglês fluente e ainda foi estudar mandarim na china. Quando ela voltou achou que as empresas com certeza a iriam aceitar, mas não foi isso que aconteceu. Quando ela procurou uma consultora de RH ela disse: alisa esse cabelo, e muda a roupa colorida que as oportunidades vão aumentar."
"Quantas mulheres que pra chegar lá, tiveram que mudar do ponto de partida?"
"Devemos formar uma aliança entre brancas, negras, indígenas, transexuais em prol de algo mais justo e pra ganhar voz."
Cida Bento
"Mulheres sempre trabalharam? Sim. Historicamente, as mulheres sempre trabalharam. Mas, em determinado momento, isso se transformou em um problema. O capitalismo motivou a segmentação entre o mercado formal masculino e o informal feminino. No século XX, o trabalho feminino era visto como complemento em relação ao trabalho do homem. Mesmo com tanta repressão, as mulheres nunca deixaram de trabalhar."
Andrea Borelli
"Quando as mulheres ascendem, muitas incorporam um jeito masculino. As instituições tem vocação pra se conservar, é difícil mudar comportamentos."
Zilda Iokoi
"É importante prestar atenção se quando sofremos algo, queremos aliviar pra quem está vindo ou se queremos fazer sofrer
também."
Zilda Iokoi
"As mulheres já ocupam cargos marginalizados. Estes são os cargos são os que mais sofrerão com a tercerização e aí ganha-se menos ainda. Cada vez mais acontece a redução de algumas conquistas."
Andrea Borelli
Mesa 3 | Arte
Com Claudia Fazzolari, Luana Saturnino, Nega Hamburguer e Samanta Coan
Foto: Renata Dantas
A mesa teve por objeto estabelecer uma reflexão acerca da participação das mulheres nos contextos das artes visuais, já que a história indica que neste contexto o gênero feminino foi estrategicamente excluído em diferentes espaços, tais como os de aprendizado, fruição e legitimação da arte. As mulheres, historicamente locadas em seus espaços, físicos e sociais, lançaram mão da materialidade que lhes era permitida: a produção de tecidos, bordado, renda, pintura de gênero, criação de utensílios etc. Tais materialidades associadas à manufatura feminina foram exploradas no universo das artes também pelos homens, adquirindo o status de criação.
"O feminismo é uma riqueza cultural e não algo que vá nos limitar."
"Nesse terreno que está sendo consolidado é importante falar sobre estas produções, que não se limitam ao gênero."
"As mulheres já expandiram enormemente seus valores no mundo da arte."
Luana Saturnin
"Comecei querendo fazer grafiti e daí já enfrentei dificuldades, por ser um mundo muito masculino. Queria mexer com esse lance de colocar na rua e tal. Os maiores problemas em ser uma menina pintando, é que quando tem esses super eventos, os caras acham que você quer afrontar, competir ou que tá fazendo pra eles, por pintar mulheres e tal, mas na realidade meu trabalho é pra mulheres. Pra elas se verem e se sentirem representadas.
Meu objetivo é que as mulheres gostem delas como elas são, sem tentar se mudar e perder sua essência.
Eu não conheço nenhuma mulher no padrão que o mundo pede. Então resolvi mostrar do meu jeito.
A minha tentativa é de falar com a mulher para que ela se veja do melhor jeito possível, sem se adequar ao que o mundo pede."
Nega Hamburguer
Mesa 4 | Corpo e Representação Social
Com Silvia Pimentel, Rachel Moreno, Valéria Sousa da ONG Artemis. Mediação: Bel Santos Mayer
Foto: Barbara Demerov
O corpo físico, a violência contra a mulher, a representação social e midiática, o cinema são alguns dos eixos norteadores da mesa.
" A mídia, grande educadora informal, com o poder que tem, deveria fazer a sociedade evoluir e não é bem isso que acontece. Uma das principais coisas que fazem é a imposição de um padrão de beleza. Um padrão de beleza único e portanto, autoritário. Falta diversidade. Em outras palavras eles dizem: 'Você só vai ser feliz, se for parecida com essas pessoas que estamos mostrando aqui."
Rachel Moreno
"A mulher grávida é um ser fragilizado, e pela a nossa cultura nós temos a tendência de desqualificar o discurso delas. Grávidas são tratadas como se não fossem capazes de entender mais sobre o parto e os procedimentos médicos. Os médicos sonegam fatos importantes que chegam a submeter as grávidas a riscos de vida. A paciente precisa consentir sobre qualquer procedimento feito em seu próprio corpo."
Valéria Sousa - Ong Artemis