Postado em 07/07/2015
Por: PAULO NATHANAEL PEREIRA DE SOUZA
Da Academia Paulista de Letras
O Brasil, gravemente enfermo por força de três crises conjugadas que sobre ele se abateram – a econômica, a política e a moral –, está desenvolvendo um esforço hercúleo para restabelecer a saúde. Para tanto, convocou-se Joaquim Levy, emérito economista patrício que, segundo consta, dispõe de algumas fórmulas mágicas capazes de tirar o país do brejo. Como todo tratamento cirúrgico, esse também deve ser doloroso e cheio de riscos para o paciente. Mas, ao que parece, não pode haver hesitação, eis que o que está em jogo é o próprio futuro da nação. Daí porque se deve torcer, com todas as forças, para que Joaquim Levy acerte na terapêutica e tire o país dessa enrascada em que o meteram os que quiseram brincar com a ciência econômica e inventaram soluções experimentalistas que não estavam no gibi.
Isso em relação à crise econômico-financeira. Quanto às outras duas, será preciso encontrar outros Joaquins para examiná-las e oferecer soluções viáveis, como a reforma política, em que se fortaleça a democracia e se ponha um paradeiro à prática criminosa da compra de votos a troco de cargos públicos e de dinheiro do Tesouro (vide Operação Lava Jato) ou a reforma dos costumes, com volta aos saudosos tempos em que, no Brasil, não se misturava o público com o privado, e o exercício dos mandatos eletivos nada tinha a ver com enriquecimento ilícito dos mandatários. O difícil será encontrar Joaquins capazes de fazer com sucesso o enfrentamento dessas ciclópicas tarefas.
Todavia não há porque desanimar, eis que, de acordo com a História, o Brasil já enfrentou situações semelhantes e conseguiu superá-las com galhardia. É o caso, por exemplo, do que houve na passagem do século 19 para o 20, com a ascensão de Campos Salles à Presidência da República. Prudente de Morais, que era um cidadão impoluto e a quem sucedeu Campos Salles, não entendia cousa alguma de ciência econômica e deixou as finanças nacionais em frangalhos (tudo agravado pela fratricida campanha de Canudos).
Coube ao novo presidente, empossado em 1898, investigar a fundo a situação, para descobrir que o país estava hipotecado aos bancos ingleses dos Rothschild e correndo o risco de execuções seguidas de dívidas impagáveis. Não teve dúvida, convocou um Joaquim disponível à época, Murtinho, político cuiabano e mago das finanças, e viajou para Londres, onde foi hospedado pelos donos do banco. Com eles estudou soluções heroicas, de onde nasceu o tratado do Funding Loan, segundo o qual os Rothschild emprestariam ao Brasil quantia correspondente à dívida, enquanto que o governo retiraria de circulação o lixo do papel-moeda emitido sem o lastro em ouro, bem como cortaria fundo no orçamento, dele retirando todas as despesas adiáveis para os anos seguintes. Como garantia, o banco receberia todas as rendas geradas pela alfândega do Rio de Janeiro, que não eram nada desprezíveis. Murtinho, como bom cirurgião, promoveu na área fiscal uma operação sem anestesia e quase matou o doente, embora com isso tivesse salvo o Brasil da falência. O preço de tais sofrimentos recaiu por inteiro sobre Campos Salles, que perdeu a popularidade, tendo sido o presidente mais mal-amado da história e, o que foi pior, empobrecido nos seus bens pessoais, todos sacrificados para que a nação se restabelecesse.
Como se vê, não há porque desesperar em face da crise que sobre nós vem desabando como um tsunami (aquele que alguém mais sábio chamou de marolinha). Enquanto houver Joaquins disponíveis, o Brasil sobreviverá.
N.R.: Artigo redigido em 24/03/2015