Postado em 31/08/2015
COMO A PRODUÇÃO E O CONSUMO DE VÍDEOS DIGITAIS TÊM TRANSFORMADO A NOSSA FORMA DE VIVER
Em viagens, shows, festas, manifestações, grandes eventos ou acontecimentos corriqueiros, lá está ela: a câmera. Com a popularização dos smartphones, a vida nunca foi tão registrada quanto é hoje. Ao mesmo tempo, jamais tivemos tanto acesso a conteúdo audiovisual – e, se há algumas décadas assistíamos a tudo apenas por meio da TV e do cinema, hoje as imagens chegam até nós também via redes sociais e plataformas como YouTube.
Para especialistas, o resultado disso é a democratização do poder do discurso audiovisual. “No campo do documentário, por exemplo, as pessoas que eram objeto de filmes hoje se filmam e constroem o próprio discurso audiovisual”, compara o cineasta Evaldo Mocarzel. “As pessoas não apenas gravam, mas editam, sonorizam e texturizam a imagem com diferentes tipos de filtro”, completa.
Evaldo observa que o volume de registros em vídeo produz uma memória de nossa época, mas pondera: “Tudo que se filma vira um documento, mas acho que existe um excesso. Na gênese da história do cinema se faziam filmes muito interessantes porque a imagem era algo pensado, não gratuito. A gente tem que se vacinar contra o excesso para separar o joio do trigo e usufruir dessa babel de imagens”.
É preciso refletir também sobre o destino desse acervo que estamos criando, defende o professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Norval Baitello Jr. “Há casos de pessoas que possuem grandes acervos de imagens, mas que não têm nem capacidade de ver esse acervo, devido ao tamanho dele”, exemplifica. “Costumo dizer que essa é uma memória que tende a se perder, com equipamentos que, em cinco anos, já não vão mais ler os suportes atuais.”
YOUTUBERS
Um dos principais ícones dessa “babel de imagens” é o YouTube. Criada em 2005, a plataforma disponibiliza conteúdo audiovisual diverso de forma gratuita. Lá, é possível encontrar desde videoclipes até tutoriais para reparos domésticos. Segundo estatísticas do próprio site, há mais de 1 bilhão de usuários em 75 países e mais de 300 horas de vídeo enviadas a cada minuto. Parte desse material vem dos chamados youtubers, pessoas que mantêm canais em que postam vídeos sobre temas diversos, muitas vezes angariando milhões de visualizações.
Com tanto alcance, os youtubers têm potencial para levar a democratização do audiovisual a um novo patamar, mas na prática isso ainda não ocorre totalmente. “As pessoas têm capacidade de participação cada vez maior, conseguem interagir instantaneamente, mas os conteúdos que mais fazem sucesso continuam sendo os que mais têm financiamento econômico”, avalia a professora do Centro Universitário FIAM-FAAM Maíra Bittencourt, que estudou os youtubers em sua tese de doutorado. “Existe influência de opinião, mas, diferentemente do que aparenta, os youtubers não seriam os maiores convocadores de discussão para refletir problemas sociais, manifestações, posicionamentos econômicos, políticos. Os vídeos que mais fazem sucesso ainda são os de entretenimento, os esquetes, os tutoriais de maquiagem, de games, e um ou outro de crítica.”
Maíra chama a atenção para o fato de que muitos seguidores buscam os youtubers pela sensação de envolvimento pessoal que há entre o público e essas figuras. “Desde que a humanidade se entende por humanidade, a vida do outro sempre chamou a atenção do público. A televisão se utilizou muito disso, e esses espaços no YouTube são uma renovação desse olhar para a vida do outro”, esclarece. “Isso vale até para os tutoriais, porque eles não costumam ser simples tutoriais. O youtuber conversa, interage, conta histórias, e aí entra esse envolvimento na vida do outro, como observador e participante daquele espaço.”
AQUI E AGORA
Além da facilidade em registrarmos o cotidiano, a nova cultura audiovisual mudou também a maneira como nos relacionamos com os acontecimentos em si. “O digital é uma revolução de costumes. Hoje as pessoas filmam tudo e se relacionam por meio do discurso audiovisual, trocando imagens e fotos, às vezes em tempo real. Com isso, a questão da presença está colocada em xeque”, resume Evaldo. “Parece que as pessoas precisam viver por meio dessa documentação audiovisual e isso esvazia a vivência presencial, o olho no olho, a troca, pois fica todo mundo com uma preocupação em estar bonito, bem enquadrado”, argumenta.
É muito comum em grandes eventos, por exemplo, encontrar pessoas que acabam assistindo tudo pela tela, complementa Norval. “As pessoas se ausentam do ‘aqui-agora’ para se transformar em registradores e perpetuadores de um momento fugaz que elas próprias não viveram”, analisa o professor.
Norval costuma usar o termo “iconofagia”, ou seja, a ideia de que o corpo devora e é devorado por imagens. “O corpo se alimenta de imagens, e não de sensorialidades, presenças. Nós acabamos desenvolvendo uma ‘presença ausente’, o que tem impactos tremendos sobre a sociabilidade”, explica. Apesar disso, Norval acredita ser possível encontrar um equilíbrio para usar a tecnologia de maneira mais saudável: “Em algum momento vamos ter que parar para pensar e refletir sobre o impacto dessas novas tecnologias, esses novos suportes e essa possibilidade fácil e barata de gravar tudo”.
A ORDEM É ZAPEAR
COM MILHÕES DE VISUALIZAÇÕES, CANAIS DE VÍDEOS ONLINE TRATAM DOS MAIS DIVERSOS ASSUNTOS
• MINUTOS PSÍQUICOS
Inscritos: 51.444
Visualizações: 1.459.793
Criado em 2014, o canal traz vídeos sobre psicologia, tratando de temas variados, como insônia, emoções e funcionamento do cérebro.
• VOCÊ SABIA
Inscritos: 2.254.886
Visualizações: 159.760.072
Criado em 2013, trata de curiosidades diversas, como “As dez maiores bilheterias do cinema”, “As comidas mais bizarras do mundo” e também responde a perguntas como: “Como seria se usássemos 100% do cérebro?”.
• MANUAL DO MUNDO
Inscritos: 3.826.828
Visualizações: 596.789.492
Um dos canais mais vistos do país, desde 2008 traz experiências, mágicas, pegadinhas, receitas, origamis, desafios e brincadeiras. Há desde receitas culinárias até experimentos como a construção de uma lâmpada química sem eletricidade.
• TINY LITTLE THINGS
Inscritos: 141.768
Visualizações: 10.790.695
Uma das booktubers (youtubers que tratam de livros) brasileiras mais conhecidas, Tatiana Feltrin faz vídeos com resenhas de títulos de autores clássicos, contemporâneos, livros obrigatórios em vestibulares e outros temas relacionados à literatura.
• PIPOCANDO
Inscritos: 632.244
Visualizações: 31.728.475
Criado em 2013, trata do universo de filmes, games e séries. Há vídeos com curiosidades, críticas, listas e afins.
TECNOLOGIA E ARTES NO SESC
PROGRAMAÇÃO BUSCA RELACIONAR O UNIVERSO TECNOLÓGICO ÀS LINGUAGENS ARTÍSTICAS
Presentes em 29 unidades do Sesc no estado, os Espaços de Tecnologias e Artes recebem atividades como oficinas, cursos, ateliês, laboratórios, exposições, instalações, apresentações artísticas, cursos de inclusão digital, palestras e seminários, além de terem horários específicos destinados ao acesso mediado à internet. Esses espaços nasceram do programa Internet Livre do Sesc São Paulo, criado em 2001 e que se caracterizou como um espaço educativo e experimental.
O objetivo dos esforços atuais do Sesc São Paulo em torno dos Espaços de Tecnologias e Artes é estimular a relação das diversas linguagens artísticas com as tecnologias, desmistificando o conceito de tecnologia como algo restrito à eletroeletrônica ou ao universo digital. Conheça alguns destaques da programação de Tecnologia e Artes de setembro e veja mais no Em Cartaz desta edição:
• SANTANA
Animação com Métodos Analógicos
A o¿cina propõe a criação de animações pela técnica de desenho quadro a quadro aplicada diretamente na película do ¿lme com base no uso de um projetor de cinema 16 mm.
De 10/9 a 15/10, quintas, das 19h30 às 21h30. Grátis. Sala de Tecnologias e Artes. Livre.
• PRESIDENTE PRUDENTE
Scnanimation
Técnica de ilusão de ótica que transforma traços e linhas em imagens em movimento. Dia 11, das 14h às 16h. Na sala de internet. Dias 12 e 27, das 16h30 às 18h. Grátis. Acima de 8 anos.
• SÃO CARLOS
Os Primórdios do Cinema
A oficina propõe a construção coletiva do fenacistoscópio, objeto óptico que permite a observação de uma sequência de imagens em movimento e que remete à origem do cinema.
Para pais e filhos: dia 5, domingo, das 14h às 15h30. Turma 1. Livre.
Para jovens e adultos: dia 27, domingo, das 15h às 17h.
• VILA MARIANA
História das Estéticas Tecnológicas: Fotografia
Com Ronaldo Entler, professor e crítico de fotografia, o curso busca pontuar elementos da história da fotografia e pensar as especificidades e as aberturas da fotografia com relação às outras linguagens.
Dias 10, 17, 24/9 e 1º/10, quintas, das 19h às 21h.
15 vagas – R$ 17 / R$ 8,50 / R$ 5. Acima de 16 anos.
• BELENZINHO
Jogos e Narrativas Ambientais
Com orientação do artista e professor Cláudio Bueno, em quatro encontros o curso pretende criar um jogo para acontecer nas áreas de convivência e/ou arredores do Sesc Belenzinho, com uso de tecnologias e possibilidades offline. De 8 a 29/9. Terças, das 19h às 21h30. 15 vagas. Grátis. Acima de 15 anos.