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Memória, Patrimônio e Museologia Social. Irradiações e Germinações
"A memória, onde cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura o passado para servir o presente e o futuro. Devemos trabalhar de forma a que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens".
Le Goff
No início de novembro, as últimas aulas do curso “Memória, Patrimônio e Museologia Social; germinações e irradiações” aconteceram no estado do Rio de Janeiro. Foram visitados Museu de Favelas – MUF, Museu da Maré, Museu Vivo de São Bento e Museu da Republica.
O curso teve como objetivo compreender as dimensões poéticas e políticas dos campos da memória, do patrimônio e do museu na contemporaneidade e estimular o desenvolvimento de práticas e reflexões em diálogo com a Museologia Social. Para isso, nas últimas aulas, o foco foi propiciar experiências diretas com práticas de Museologia Social desenvolvidas na cidade do Rio de Janeiro.
O professor convidado a realizar esse curso foi Mário de Souza Chagas, poeta, museólogo, professor da UNIRIO, mestre em Memória Social e doutor em Ciências Sociais. É um dos responsáveis pela Política Nacional de Museus e um dos criadores do Sistema Brasileiro de Museus, do Cadastro Nacional de Museus, do Programa Pontos de Memória, do Programa Nacional de Educação Museal e do Instituto Brasileiro de Museus.
O chão da casa de onde falo, território em que piso e de onde parto para a aventura museal, tem conexão direta com a poesia que na primavera da vida me conquistou; com a museologia que me tocou no verão e com as ciências sociais que no outono contribuíram para o (des)encanto e a perspectiva de um inverno onde tudo se junta e se mistura para celebrar a vida.
Mario Chagas
Para aprofundar este mergulho por práticas de museologia social foi realizada uma viagem de estudos para conhecer práticas museais no Rio de Janeiro.
De quantos percursos é composto um museu?
O que está nas paredes das Casas-Tela faz parte de nossas vidas. Nós vivemos isso.
A primeira visita foi ao MUSEU DE FAVELAS – MUF, que tem como acervo central as próprias pessoas que ali habitam, suas histórias, cultura, lutas, saberes e fazeres. Os depoimentos de moradores foram recriados e pintados nas fachadas das casas, formando um museu de percurso espalhado pelas três comunidades.
Além de ser um museu a céu aberto o MUF tem uma sede que abriga exibições a céu aberto e outros projetos, como o Prêmio Mulheres Guerreiras que, desde 2011, todo ano homenageia mulheres.
Um cuidadoso processo de escuta de histórias de força e afeto do qual nasce uma exposição. Contou também com a formação de escutadoras da comunidade, trocas de carta, reuniões e oficinas de design para elaboração da exposição considerando os saberes têxteis e artísticos das participantes.
De quantos tempos é feito um museu?
"A memória, onde cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura o passado para servir o presente e o futuro. Devemos trabalhar de forma a que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens".
Le Goff
O segundo ponto foi o MUSEU DA MARÉ. Um museu que nasce em 2006, mas que na verdade vem de muito antes, vem do engajamento de moradores que já realizavam muitas ações como o cursinho pré-vestibular do Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré, além de outras atividades educativas e culturais. Dentre as diversas ações, durante a construção de um vídeo, alguns jovens se deparam com histórias contadas pelos moradores mais velhos, até então desconhecidas por eles. Essa é apenas uma das muitas sementes que moveram uma pesquisa maior sobre a história do Complexo da Maré. Atualmente o Museu conta com ações de registro, preservação e divulgação da história das comunidades da Maré, dentre outras ações. Sua exposição permanente é construção de todos estes anos de (re)existências.
A exposição permanente do Museu da Maré foi concebida em 12 tempos: tempo da água, tempo da casa, tempo da migração, tempo da resistência, tempo do trabalho, tempo da festa, tempo da feira, tempo da fé, tempo do cotidiano, tempo da criança, tempo do medo e tempo do futuro.
Com quantas pessoas é construído um museu?
"Muito trabalho de pesquisa somado à valorização do patrimônio local e a parcerias com os professores e alunos da rede pública. Contra todos os desafios da região, o Museu é um espaço para cada caxiense chamar de seu. O percurso leva a museologia para a rua, e transforma a cidade em acervo, a ser cuidado e difundido pelos seus moradores e visitantes".
Ana Luiza Rocha do Valle, museóloga participante do curso.
A terceira visita foi o MUSEU VIVO DE SÃO BENTO, que mais que um lugar, está nas ruínas de uma antiga fazenda no sítio arqueológico indígena, histórias de sambaquis, tupinambás, ocupação lusitana, resistência quilombola, mas também das novas ocupações, suas lutas e resistências, com enfoque na educação patrimonial em cumplicidade com a população local.
Quantas possibilidades de (re)invenção carrega um museu?
O ponto final foi o MUSEU DA REPUBLICA, onde além da visita foi levantada a perspectiva de que um museu histórico pode traçar linhas de conexão com a museologia social. Na sequência, uma avaliação intensa e emocionada foi realizada pelo grupo composto profissionais da área, estudantes e interessados.
Tais museus são antes de tudo as pessoas que o compõem, são suas histórias, suas lutas, produções e (re)existências, como Luiza Gianesella, participante do curso aponta “no final das contas não importa o museu, importa a estrela que a lona aponta”. Importa sim, a direção para onde apontam como dispositivos de ocupação do passado, presente e futuro.
Para saber mais sobre os museus, acesse:
Sobre o Prêmio Mulheres Guerreiras: