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Imagens: Reprodução
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REFUGIADOS DE DIFERENTES PAÍSES COMPARTILHAM HISTÓRIAS E CONQUISTAS AO FAZER DO BRASIL UM LAR

 

Todo aquele e aquela que não conhecemos podem ganhar rapidamente o véu do preconceito. E, assim, criamos uma imagem distorcida do outro e perdemos a chance de nos relacionar com quem veio de outro lugar, quem fala outro idioma, quem possui outra cultura. No mês em que se celebra o Dia Mundial dos Refugiados (20/6), ressalta-se a importância de ouvir e aprender com homens, mulheres e crianças que estão fora do seu país de origem devido à violação de direitos humanos, a conflitos armados, ao temor de perseguição por questões de raça, religião, etnia, pertencimento a determinados grupos sociais ou opinião política. Afinal, ouvir em primeira pessoa as vivências de alguém em situação de refúgio é de “extrema importância” no combate à xenofobia, disse Miguel Pachioni, assessor de comunicação da Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Refugiados (Acnur), em entrevista à Revista E (leia matéria Únicos e Plurais, da edição nº 290, de dezembro de 2020). Neste Depoimento, vamos saber um pouco das motivações que levaram Hesouwe Soh Tchao (Togo), Carlos Ernesto Duran Llanos (Peru) e Lara Lopes (Moçambique) a construir no Brasil uma nova morada. Cada uma das narrativas foi colhida remotamente durante o isolamento social pelas equipes das unidades do Sesc Consolação, Sesc Osasco e Sesc Piracicaba, para compor o painel Histórias de Refúgio e Migração.

 

79,5 milhões de pessoas foram forçadas a se deslocar de seu país de origem até o final de 2019

Fonte: Agência da Organização das Nações Unidas para os Refugiados - Acnur/18 de junho de 2020

 

 

LONGE DO MEDO

 Carlos Ernesto Duran Llanos (Peru)

"Sou refugiado no Brasil faz 29 anos. Eu nasci em Pomabamba, no Vale de Pomabamba, nos Andes Peruanos. Quando eu tinha 12 anos, eu e minha família fazíamos viagens a Yungay. Naquela época não tinha estradas asfaltadas e nós tínhamos que viajar a cavalo. Quando chegávamos ao Parque Huascarán, patrimônio mundial pela Unesco, nós passávamos a noite à beira do lago Llanganuco, de água azul turquesa, rodeado com montanhas de neve permanente e uma lua cheia.

Quando eu cheguei no Brasil, tivemos que chegar à zona da Estação da Luz e da Cracolândia e, para mim, aquele lugar era um paraíso, porque na minha terra, quando apareceram, os terroristas [Sendero Luminoso, grupo de guerrilha criado na década de 1960, responsável pela morte de milhares de pessoas] provocaram medo de morte. E eu fui testemunha da morte de um inocente na minha frente, que foi morto por não participar da luta armada. Olha, éramos muitas pessoas com a claridade da lua cheia, mataram uma pessoa e eu não fiz nada. Por quê? Por medo. Porque eles colocavam todos os mortos na estrada para que as pessoas vissem, colocados como carcaças de animais para que as pessoas tivessem medo. Eu vivi isso. Me obrigaram a colocar nesse morto inocente um cartaz cujo título era: ‘Assim morrem os dedos-duros’. É a mesma coisa do domínio com o medo. Então, tivemos que fugir, eu e minha família, para o Brasil. Obrigado, Brasil, pela oportunidade de conhecer esse país maravilhoso, reconstruir minha vida e a vida das minhas filhas, que hoje já são profissionais.”

 

 

 

CONTRA O PRECONCEITO

 Lara Lopes (Moçambique)

"Um dos motivos que ressaltaram a vontade de vir morar no Brasil foi uma novela que assisti na televisão. Essa novela, se não me engano, retratou o primeiro casal de lésbicas no Brasil. E isso chamou muito a minha atenção porque eu vivia num país em que a questão da homossexualidade é um tabu enorme. Não se fala tanto da homossexualidade, da sexualidade. Então, imagine uma mulher se afirmar lésbica num país africano? É uma coisa que, infelizmente, cria diversos tipos de agressões, tanto físicas, quanto psicológicas, e eu passei por tudo isso. Assistir a uma novela que retratava um casal de lésbicas, para mim, foi uma luz no fim do túnel. Imagina você, como é uma filha falar para a mãe, uma filha única falar para a mãe que é lésbica? É bem difícil. Na verdade, a única coisa que eu queria era que ela me respeitasse.

Eu e minha parceira conseguimos ser mães. Estamos juntas há nove anos, desde Moçambique, e em 2019 eu me formei e a gente começou o processo de inseminação dela. Foi um processo bonito desde a escolha do doador. A gravidez foi muito bonita. Hoje nosso bebê está aqui, tem quatro meses e está grandão. Por incrível que pareça é como se ele fosse uma magia nas nossas vidas. Eu falo que meu filho tem poder e trouxe uma aceitação que a gente nunca imaginou, ele trouxe uma sabedoria e uma luz que eu não esperava. Eu quero dar uma educação para ele diferente daquela que eu tive. Quero que ele conheça minha história desde a raiz, desde a minha base. Acredito que contando a ele a minha história e a história da minha esposa ele vai criar em si uma personalidade forte. Eu quero que ele seja forte e capaz de responder ao preconceito de ter duas mães sem se inferiorizar.”

 

 

 

CAMINHO DO GUERREIRO

 Hesouwe Soh Tchao (Togo)

"Eu sou (do povo) kabye, da região de Kara. Sou de uma família de seis filhos. Eu tenho cinco irmãs e sou o único homem. Sobre minha infância, posso dizer que eu passei uma infância maravilhosa. Eu gostava de jogar futebol e quando a gente tinha um pouco de tempo a gente ia pescar, caçar no mato, e à noite, quando a gente conseguia ver que os pais estavam dormindo, dava para a gente sair no mato e fazer uma colheita de mel.

Eu saí do meu país porque eu estudei na área de sociologia e na área de recursos humanos, mas o salário era baixo. Então, eu falei: Eu vou sair e estudar outra coisa, tipo a medicina, para poder voltar e ganhar bem. Meu caminho não era chegar no Brasil, era para ir à Bolívia estudar medicina. Só que, quando eu cheguei aqui, uma pessoa de check in (do aeroporto) pegou meu passaporte, me falou que com a passagem que eu comprei não dava para ir até a Bolívia. Foi um momento muito difícil para mim porque eu passei cinco dias no aeroporto, e uma noite eu fui chamado para retornar ao meu país. O avião estava pronto para me mandar de volta. Eu passei a noite chorando no aeroporto e falei que saí do meu país para poder estudar. Fiz muito sacrifício para deixar isso passar. Para um africano sair da África é porque a pessoa está carregando um sonho. A pessoa tem um ideal a chegar. De verdade, não foi fácil. Para sair da África e chegar aqui, é um caminho de guerreiro.”

 

 

 

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