Sesc SP

Matérias da edição

Postado em

Múltiplas faces




Pintura, gravura, fotografia, arte concreta e pop art marcam diferentes fases da trajetória de Geraldo de Barros


Geraldo de Barros evidenciava em suas obras o apreço pela experimentação e pela liberdade de criação. Nascido em 1923, começou a estudar pintura em ateliês nos anos 1940, tendo como um de seus mestres o pintor Yoshiya Takaoka (1909-1978). De acordo com Fabiana de Barros, artista plástica e filha de Geraldo, foi Takaoka quem ensinou ao aluno a importância da liberdade. “Aprendendo a linguagem da pintura de paisagem, meu pai perguntou a Takaoka: ‘Estou vendo o céu vermelho, como devo pintá-lo?’. Ao que ele respondeu: ‘Você pagou a tela, o pincel? Então pinte!’. Penso que esse diálogo o introduziu na questão da liberdade, ou seja, se está tudo ok socialmente, vá, siga em frente”, relata.


E assim o fez, em um caminho artístico longo e variado em modalidades. Desenho, fotografia, pintura, gravura e design de móveis, manipulados ao seu gosto inovador. Seu trabalho com fotografia – fase preferida de Fabiana –, pode ser dividido em duas etapas. De 1946 a 1951, produziu as Fotoformas, tendendo a experimentações geométricas e estudos de luz. Já de 1986 a 1995, ocorre a retomada da técnica, com recriações com base em recortes de negativos de filmes. Para Fabiana a produção fotográfica é emblemática, pois “ele a projetava em sua mente e a praticava como se ninguém o tivesse feito antes”.


Geraldo comprou sua primeira câmera Rolleiflex em 1946. A máquina era acompanhada de um manual de instruções, com regras de como fotografar e com recomendações do que não se deveria fazer, por exemplo, riscar o negativo do filme fotográfico, captar imagens contra a luz. E sua estreia na fotografia deu-se dessa forma, pelo que era tido como proibido na teoria, mas possível de experimentar na prática.


Fabiana relembra que o pai, morto em 1998, dialogou com vários momentos da arte brasileira. “Nos anos 1940, relacionou-se com o expressionismo. Depois conhece Mário Pedrosa (1900-1981), mentor de grandes artistas, como Lygia Clark (1920-1988)”, contextualiza. Em seguida, ruma naturalmente para a arte concreta, contato que se deu localmente, tendo sido mediado por um intercâmbio intenso e frutífero com artistas latino-americanos, como o pintor uruguaio Carmelo Arden Quin (1913-2010). “Nos anos 1960 passa pela pop art e nos anos 1970 tenta uma arte mais conceitual, além dos experimentos, buscando meios diferentes para dizer o que queria”, completa Fabiana.


Com uma exposição e o lançamento de um livro (veja o boxe Memória viva), uma das intenções de Fabiana é atingir os jovens, percebendo qual a sensação dessa geração diante das obras deixadas por Barros, pois a produção é essencial ao entendimento da história da arte brasileira. “As obras, em suas diversas fases, são coerentes com o momento no qual vivemos, com as pessoas tomando consciência da coletividade com as manifestações, por exemplo. Ele atuou como artista visual, porém conseguiu influenciar contextos políticos e sociais”, completa.



Memória viva

Exposição e lançamento de livro celebram obra do artista

Detentor do maior acervo de Geraldo de Barros na América Latina, o Sesc estabeleceu uma relação de longa data com o artista. Geraldo de Barros: Jogos de Dados e Sobras (1980-1990) é a quinta exposição individual realizada na instituição, mas é a primeira em que a obra será vista em paralelo com duas séries produzidas em sua maturidade criativa, Jogos de Dados, dos anos 1980, e Sobras, de 1990.


A curadoria foi uma parceria entre os artistas visuais Fabiana de Barros, filha de Geraldo, e Cris Faria e o cineasta Michel Favre, que fazem parte do Grupo de Estudos Curatoriais na Obra de Geraldo de Barros. “O grupo não é formado só por nós, mas por todos que se interessam pelo trabalho”, diz Faria. “Penso que Geraldo estaria contente com o resultado da exposição em função dos pontos em que nos inspiramos ao montá-la, ou seja, a arte social e a preocupação com o espectador”, completa.


Já o livro Geraldo de Barros: Isso (Edições Sesc, 2013), organizado por Fabiana, é fruto da relação construída entre o Sesc e o legado do artista. “A publicação está estruturada cronologicamente e entrelaça de forma inédita as técnicas que ele explorou quase simultaneamente: desenho, fotografia, pintura, gravura e design de móveis”, explica Clívia Ramiro, da coordenação editorial da Edições Sesc. “Além disso, apresenta Geraldo sob o olhar de seus pares, por meio de uma série de entrevistas de Michel Favre com Thomaz Farkas (1924-2011), Augusto de Campos e Paulo Herkenhoff.”


A exposição que pode ser vista na unidade Vila Mariana até o dia 8 de setembro foi complementada por três encontros promovidos no mês de julho. Neles, o público foi convidado a discutir a produção artística e os pontos abordados no livro recém-lançado.