Sesc SP

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In Cômodos – A Casa e a Cidade

Estar na cidade é estar em seus espaços densos e em seus vazios. Alternar-se como o corpo que age e o corpo que sofre as ações ou as omissões dos diferentes agentes sociais. A cidade repele a neutralidade. Ela a absorve, quando necessário, mas não a estimula. A despeito da relativa passividade de parte de seus habitantes, a cidade os provoca. O tempo todo. Ocupar o ambiente urbano é quase ser levado a tomar partido, e isso se torna especialmente marcante nas grandes cidades, repletas de contradições e desafios diários como o transporte, a assistência social, o emprego, a qualidade de vida. Não é tarefa fácil sentir-se confortável nos ambientes densamente povoados que dividimos uns com os outros todos os dias. Todo espaço verdadeiramente habitado traz a essência da noção de casa, disse Bachelard, referindo-se ao conforto emocional que a lembrança do abrigo da infância nos evoca. Essa seria uma boa meta para a coletividade, a de garantir bons espaços para a ocupação humana, em todas as suas dimensões – física, intelectual, espiritual e afetiva. Garantir a existência de lugares para onde nós gostaríamos, sempre, de voltar.

Nesse sentido, a implantação de uma Unidade do Sesc em uma cidade como Guarulhos, a segunda maior cidade do estado de São Paulo, vem acompanhada de vários significados. Ela se insere em uma região não central do município, o que desloca parcialmente o olhar de seu habitante, provocando novos fluxos. Um ponto a mais no do-in antropológico, de Gilberto Gil. Ao mesmo tempo, ela amplia a ação do Sesc na Grande São Paulo, estendendo sua abrangência geográfica. Ou seja, ela estica Guarulhos para suas bordas; ela estica o Sesc para fora da capital. Uma pequena, mas importante ação a reforçar a autonomia da cidade de Guarulhos em relação à sede da grande metrópole. Isso também nos permite dar mais visibilidade à cidade que pulsa por detrás das rodovias e das rasantes dos aviões: aos seus fazedores, seus aprendizes, sua gente. Em um momento em que parte da sociedade atribui pouca relevância aos trabalhos sociais, a chegada do Sesc a uma grande cidade, onde entrega uma de suas maiores Unidades, não deixa de ser uma significativa contribuição para o entendimento da ação educativa como fator de transformação das comunidades. Com o tempo, esperamos, esse centro de atividades se transformará em um centro de referência e de afeto. Mais uma casa repleta de ambientes, que o guarulhense pode ter como sua.

Há muitos espaços no novo Sesc. Espaços para o corpo novo, o corpo velho, o corpo só e o corpo em relação com outros corpos. Espaços para o cultivo da terra e da alma. De todos eles só se requer que estejam ocupados, porque um lugar, sem as pessoas, não é um lugar. É no contato entre ideias e pessoas que o espaço começa a fazer sentido para além de sua própria estrutura. Como nos ensina Milton Santos, mais importante que a consciência do lugar é a consciência do mundo, obtida através do lugar. Isso pode dar-se pelas características mesmas de um espaço, quando este favorece o convívio, ou pelas ações propositivas que nele se encontram e que levam ao contato com aquilo sobre o que não se havia pensado. É preciso mostrar à alma coisas que ela ainda não viu, sugeriu Montesquieu. Se assim for, que este seja o local da surpresa constante, onde a neutralidade ceda lugar ao deslumbramento. A soma do conforto da casa e da diversidade das ruas, do espaço compartilhado. Para que cresçamos sempre, e voltemos sempre, e nos queiramos sempre próximos uns dos outros.
 

Oswaldo Almeida Jr. é especialista em Gestão e Políticas Culturais e gerente do Sesc Guarulhos.

 

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