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Fábrica de talentos
Um prédio instigante que cativa quem passa e desperta a vontade de entrar. O Sesc Pompeia segue autônomo na escrita de sua história. Inaugurado em 22 de janeiro de 1982, logo se tornou um dos espaços mais visitados na cidade, local privilegiado para a convivência e o usufruto da cultura e do lazer em suas diversas manifestações.
A vida que pulsa entre as paredes nada convencionais da fábrica transborda em uma programação democrática que reúne gostos e interesses variados, compondo o painel diversificado de frequentadores e dos próprios artistas que estiveram fortemente envolvidos
em shows, performances teatrais e exposições. É o caso do músico Arrigo Barnabé, que imagina ter feito, aproximadamente, 70 shows na unidade. “Lembro quando o Pompeia começou e os primeiros shows impactantes que fiz, com temporadas lotadas. Era eletrizante. Virou uma referência, havia familiaridade com o espaço, era como a nossa casa”, relembra Arrigo.
É difícil enumerar os eventos marcantes que tiveram a unidade como cenário. A lista poderia seguir por páginas e páginas... Alguns deles, no entanto, já fazem parte da identidade cultural de São Paulo, como o festival de punk rock O Começo do Fim do Mundo,
ocorrido em 1982, ou o programa Fábrica do Som, gravado no teatro da unidade e exibido pela TV Cultura entre os anos de 1983 e 1984. Shows de nomes-chave da MPB, como Gilberto Gil e Maria Bethânia, fizeram história na cena musical nacional.
Exposições como a que homenageou o poeta Ferreira Gullar em 2003 fica ram na memória. E no campo das artes cênicas foram inúmeros os espetáculos premiados que passaram pelo Pompeia. Entre os mais recentes está a peça O Idiota – Uma Novela Teatral, inspirada nos 12 capítulos da obra homônima do escritor russo Fiódor Dostoievski (1821-1881), dirigida por Cibele Forjaz e premiada pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) em 2010. A peça teve uma versão em três e em dois dias,
mais uma versão integral com sete horas de duração.
“A principal qualidade da peça era justamente ser uma travessia, tanto para os atores quanto para a plateia. A cenografia se utilizava exatamente da linguagem do galpão e de Lina Bo Bardi, a estrutura arquitetônica, espaços vazios, formas simples e essenciais. Então, a principal característica da ocupação espacial era justamente usufruir da beleza do espaço do Pompeia, revelar
sua estrutura, acolher a plateia, traçando uma relação física e emocional com o espaço”, resume Cibele.
Na história da unidade, não faltaram exposições de destaque, como Caipirias, Capiaus: Pau-a-Pique, de 1984; Mil Brinquedos para a Criança Brasileira, de 1982; e Alice no Brasil das Maravilhas, de 1989, com curadoria de Joãosinho Trinta.
Esses foram apenas alguns marcos da história da unidade, que reforçaram a conexão entre o público frequentador e a estrutura viva e harmônica do Pompeia. A programação intensa tem ritmo constante, sem deixar de reverenciar a própria trajetória.
A casa é sua
Projeto desenvolvido Por Lina Bo Bardi ganhou o coração dos paulistanos O encanto que cerca o prédio do Pompeia é potencializado por sua origem. Construído em 1938, o local abrigou durante a década de 1940 o cotidiano de uma fábrica e seus trabalhadores.
“A construção se organiza em torno de uma rua sem automóveis e dedicada aos pedestres, ao contrário do que acontece na cidade. Há uma franqueza de acesso. Você está caminhando pela calçada da rua Clélia e de repente vê um portão totalmente aberto te chamando para dentro e logo se formam os pavilhões que se organizam para os eventos artísticos”, explica o arquiteto André Vainer, que juntamente com Marcelo Ferraz, foram arquitetos assistentes de Lina Bo Bardi, (1914-1992), no período de restauração da fábrica.
A ideia era torná-la “um centro de lazer e convivência”, como a arquiteta mesmo registraria no texto “A Fábrica da Pompeia”, escrito em 1986, e parte do livro Cidadela da Liberdade – Lina Bo Bardi e o Sesc Pompeia (Edições Sesc, 2013), organizado por Wainer e Ferraz, também curadores da exposição Sesc Pompeia 30 anos, em cartaz na unidade até 30 de junho. Em declarações de Lina reproduzidas na exposição, podemos entender qual o tamanho da experiência para a arquiteta.
Em uma delas, compara os paralelepípedos ali existentes a documentos de uma civilização. De acordo com a coordenadora de programação Ilona Hertel, o evento reúne informações históricas sobre o processo de planejamento e execução do projeto de restauro e construção das instalações da unidade Pompeia, que vai atrair estudantes e arquitetos. “Mas a exposição interessará, também, ao público em geral, frequentadores da unidade, em sua programação variada e que relaciona a história deste centro
de lazer e cultura com sua própria trajetória”, afirma. Ilona acrescenta que o material coletado para a exposição revela uma pequena mostra do que já foi realizado na unidade, ao longo dos últimos 30 anos. “A escolha dos curadores recaiu sobre os eventos marcantes e que ficaram registrados na memória das pessoas”.