Sesc SP

A Semana da Diversidade Sexual de Araçatuba decidiu expandir a programação além dos palcos e vai levar arte para diversos pontos da cidade. Retratos de drag queens darão um colorido especial às ruas e a paisagem cotidiana. Obras feitas em Paris, São Paulo, São Francisco e Nova Iorque retratam famosos personagens nacionais e internacionais, além de nomes do cenário local, criando um diálogo direto entre o street art e o universo LGBT.

Rafael Suriani é brasileiro, mas sua arte tem sido espalhada pelas ruas de Paris, onde atualmente vive. O grafiteiro utiliza de seu trabalho para contribuir com a visibilidade da cultura drag, assim como busca inserir influências da temática LGBT na cena street art, dominada por códigos masculinos.

Em entrevista a EOnline, Suriani, responsável pelo projeto e intervenção “It’s Not Personal, It’s Drag!” conta um pouco sobre as diferenças culturais entre Brasil e Paris. O artista também mostra como a política é refletida em sua arte e na luta pela igualdade.

ARTISTA
Desde pequeno sempre desenhei e soube que queria ser artista. Acabei cursando arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), porque é uma escola bem aberta às artes visuais. Foi nela que desenvolvi meus primeiros projetos de arte urbana e nunca mais parei.

INSPIRAÇÕES
Me inspiro muito nas culturas urbanas. Música, moda e trabalhos de outros artistas de rua são coisas que me ajudam a criar. Mas também gosto da natureza e de mitologias, principalmente nas minhas séries de personagens híbridos homem-animal. Há dois anos tenho tirado muita inspiração da cultura Drag Queen e de temas ligados às questões de gênero.

EXPRESSÃO
Em 2013 participei de um projeto da associação ACT-UP que reuniu, em Paris, artistas em prol das causas LGBT. Nesse momento, projetos de leis que garantem à igualdade de direitos para casais do mesmo sexo estavam sendo tratados na esfera política. Houve também grandes manifestações nas ruas, organizadas por grupos conservadores, para impedir o avanço das leis, em nome dos valores tradicionais da “família”. Senti a necessidade de expressar a beleza da diferença, a aceitação e a liberdade de expressão, de forma alegre e positiva. Esses são justamente valores difundidos pela cultura drag, e foi assim que nasceu o projeto “It’s Not Personal, It’s Drag”.

TEMÁTICA
A temática LGBT veio de forma natural para o meu trabalho. Surgiu pela vontade de expressar meu ponto de vista político sobre temas relacionados à igualdade de direitos e por uma vontade de contribuir com a visibilidade desta cultura. Acredito que estou contribuindo de alguma forma com a luta contra os preconceitos e a discriminação que infelizmente, ainda hoje, atingem as comunidades LGBT.

TÉCNICA
Eu pinto os personagens com tinta acrílica sobre papéis de grande formato. Depois corto a silhueta do personagem e colo nos muros como lambe-lambes. Essa técnica é conhecida no meio street art como paste-up ou wheatpaste, pois a cola muitas vezes é fabricada com farinha de trigo.

PARIS
Sempre gostei de viajar. Já morei no interior dos Estados Unidos e em Nova Iorque antes de decidir me instalar em Paris. A Europa é um continente muito legal para quem curte descobrir novas culturas. Viajar é mais fácil e barato. Além disso, gosto bastante da cultura francesa e do caráter multicultural de Paris.

DIFERENÇAS
Na França o acesso à arte é mais democrático que no Brasil. Em terras brasileiras, tirando o grafite e o street art que são manifestações populares e acessíveis por excelência, a arte ainda me parece confinada a um espaço muito restrito e elitista. Já em Paris existem muitos incentivos públicos, espaços de criação e associações artísticas que possibilitam que um maior número de pessoas se expressem.

TOLERÂNCIA
Muita coisa precisa mudar em relação à tolerância com a cultura LGBT. Desde a revolta de Stone Wall em NYC no final dos anos 1960, muito progresso tem sido conquistado, mas ainda estamos longe de atingir uma situação de igualdade de diretos e de respeito. A homofobia ainda existe no mundo todo e muita gente sofre por causa disso. Enquanto não atingirmos esse patamar de igualdade e respeito, temos que continuar lutando. Atualmente, questões de gênero têm sido discutidas na esfera política mundial e estamos progredindo num ritmo mais acelerado. A noção de gênero está sendo aos poucos redefinida por artistas, intelectuais e militantes das causas LGBT, mas ainda há muito trabalho a ser feito.

DURANTE A SIM
Em Araçatuba, vamos realizar uma série de colagens pelas ruas mostrando personagens conhecidos da cena drag internacional e nacional. Os artistas locais não serão deixados de lados e integram o projeto. Além das intervenções pelas ruas, haverá uma exposição de pôsteres que mostram colagens feitas pelo mundo nos últimos dois anos.