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Eu vi um sacy!

De gorro vermelho, livre como o vento
e traquina por natureza, esse ser
fantástico do folclore continua
a encantar crianças e adultos

 

Você já viu um menino zombeteiro, de uma perna só e gorrinho vermelho passeando por fazendas e parques? Dizem que ele cria confusão por onde passa, assustando viajantes e aprontando traquinagens. Pelo menos é assim que o descreve o historiador e antropólogo Luís da Câmara Cascudo no Dicionário do Folclore Brasileiro. Editada, originalmente, há 64 anos, pelo Instituto Nacional do Livro, a publicação demonstra que os primeiros registros do sacy, no Brasil, remontam ao século 19. E há quem afirme de pé junto que ele existe tal qual o folclorista apontou.

Mas antes de Câmara Cascudo, o escritor Monteiro Lobato também havia investigado a existência desse irreverente protagonista das matas em O Sacy-Pererê: Resultado de um Inquérito, lançado há exatamente um século. Na época, o autor havia publicado no jornal O Estado de S.Paulo uma pesquisa em que pedia aos leitores que lhe escrevessem narrando suas experiências com sacys.

Em 1918, Lobato recebeu centenas de cartas – principalmente de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro – com curiosos depoimentos. Alguns escreviam que se tratava de um ser do tamanho de um menino de 11 anos; outros afirmavam que ele era banguela ou que tinha um rabo. Tais relatos serviram de base para a centenária publicação, além de outras tantas obras em que Pedrinho, um dos mais famosos personagens do autor, aventura-se atrás desse ser endiabrado.

 

Sementes da imaginação

Apesar de referências tanto na história cultural quanto no universo literário, será que as crianças de hoje acreditam em sacy? Ou será que já viram algum? A fim de reaproximar essa figura folclórica de uma realidade cada vez mais urbana, o Sesc Interlagos realiza a exposição #OCUPASACY a partir deste mês. Um projeto que, idealizado pelo curador Rudá K. Andrade há 13 anos, busca fazer o que ele mesmo chamou de “reflorestamento de sacys no imaginário”.

“Essa figura dos tempos antigos traz reflexões importantes que não deveriam ser esquecidas. Valores e práticas como a afeição pela natureza, o estímulo à criatividade, o vínculo intergeracional, o hábito de contar histórias, a brincadeira, o apreço pela cultura popular, a estima pela liberdade, o respeito e a solidariedade. Tudo isso, o sacy pode nos ensinar”, explica Rudá, que recorda ter visto os primeiros sacys aos cinco anos de idade, quando costumava caçar sapos em sítios, acompanhado da irmã mais velha.

Quem também já viu alguns sacys ao longo da vida foi o cenógrafo da exposição, Jefferson Duarte. “Sempre acreditei na existência desse ser encantado, mesmo tendo sido uma criança urbana. O sacy é um representante da crença no mágico, no livre, no imperfeito”, conta.“Sempre acreditei nas forças e nos mistérios do vento, dos sons emitidos pelos pássaros, na força que vem das folhas.” Elementos que refletem uma atmosfera de encantamento e imersão na fantasia da cenografia de #OCUPASACY.

 

 

Para isso, Jeff recria uma fazenda dentro da unidade Interlagos, acrescentando-lhe a desordem e a brincadeira, características dos membros da Irmandade dos Sacys Livres – além do sacy-pererê, outros sacys povoam as florestas. Dessa forma, o público é convidado a sentir, ouvir e observar a existência desses seres. Há, até mesmo, laboratório, galeria de artes, cozinha (parece que os sacys gostam muito de comer piruá), além de uma Sacyoteca – espaço com formato de garrafão com 350 garrafas que servem de prisão para alguns da espécie.

Para dar as boas-vindas a esse universo lúdico, uma porteira aberta indica o início da ocupação. “Portas com cara de interior do Brasil, pintadas em azul colonial, sempre abertas e com sacys morando dentro das fechaduras, sinalizam as entradas para cada ambiente. As poucas paredes são amareladas pelo tempo e pelas pegadas feitas pelos moradores ao brincar”, descreve o cenógrafo.

 

 

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