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Labirinto da imagem e do som



Na década de 1970, um grupo de artistas plásticos desafiou a tradição ao agregar elementos audiovisuais em obras que se tornaram marcos de uma geração


Devido à proeminência do recurso digital, hoje as expressões artísticas de alguma forma dialogam com as novas mídias e fazem com que os realizadores incorporem elementos e linguagens até então não utilizados.

Contudo, tais experimentações não são tão óbvias se considerarmos o panorama dos anos 1960, quando os artistas ainda tateavam materiais e opções que acabavam de se tornar acessíveis. É o que explica a professora do programa de mestrado e doutorado em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Mackenzie e de Arte Contemporânea e Cinema na Escola do Museu de Arte de São Paulo (MASP), Jane de Almeida, que estuda a presença de obras audiovisuais em exposições de artes, investigando a relação entre elas e a arte contemporânea. “O que sabemos dessa época é que os artistas plásticos estavam testando materiais cinemáticos que se tornaram acessíveis no fim dos anos 1960 e início dos anos 1970. Parece-me que grande parte dos trabalhos tratava de desarticular a própria linguagem do cinema convencional para experimentar uma forma ‘livre’ de imagem em movimento”.
O ponto de partida para as novas possibilidades foi a Expoprojeção 73, realizada pela curadora e crítica de arte Aracy Amaral, que ainda hoje diz não ter a resposta de por que teriam sido os artistas plásticos que exploraram o som, o formato Super 8 e audiovisuais e não os fotógrafos. “Os artistas detinham a tradição de trabalhar no espaço – a tela, a parede, o papel –, e não no tempo, o filme, a projeção em movimento. Expoprojeção é um nome meio híbrido, entre exposição e projeção, para mostrar o trabalho em conjunto pela primeira vez”, recorda Aracy.
Desde então, a diversidade de formas, conteúdos e linguagens passou a ser constante. Na opinião do curador independente e produtor cultural Roberto Moreira S. Cruz, o mais marcante desse recorte temporal é a variedade da produção. “A diversidade não está só nos formatos, mas na linguagem e na maneira de trabalhar com o repertório da imagem em movimento. A partir da década de 1970, o artista brasileiro interessado no potencial do audiovisual como forma de expressão começou a utilizar o cinema e o vídeo como ferramentas”, afirma. “E nesse grande repertório de propostas estéticas observam-se as obras de narrativas poéticas, vídeos como performances, filmes estruturais, a relação da imagem com o tempo e o espaço da exibição, enfim, um campo bastante extenso de pesquisa e realização audiovisual.”
Jane cita uma declaração da escultora e pintora Lygia Pape, registrada no catálogo da exposição de 1973, que é pertinente para os dias de hoje. “Ela fala da liberdade de trabalhar com o Super 8 – diferentemente do cinema, que passa por um processo de castração com a montagem, a pós-produção, até a bilheteria, pois o diretor tem de se submeter ao ‘gosto comum’”, analisa. “Naquela época os materiais eram outros: Super 8, 16 mm, além dos experimentos sonoros com vinil. Hoje quase tudo é digital. Portanto, as experiências materiais anteriores são muito particulares daquele período. Claro que um artista hoje pode realizar trabalhos com aquele material, mas notaremos algo de nostálgico, temporalizado.”

BOXE - Experimentação Pioneira

Sesc Pinheiros traz panorama representativo ¿da produção de artistas brasileiros e ¿suas experiências com a linguagem audiovisual

O ano era 1973, e os artistas brasileiros pouco se arriscavam no desenvolvimento de obras que utilizassem recursos audiovisuais. Porém o grupo que tateava nos meandros da imagem em movimento aplicada às artes plásticas teve espaço na Expoprojeção 73, realizada pela crítica e curadora de arte Aracy Amaral na sede do GRIFE (Grupo dos Realizadores Independentes de Filmes Experimentais), em São Paulo, e apresentada no mesmo ano em Buenos Aires, a convite do Centro de Arte e Comunicação (CAYC, na sigla em espanhol).
Quarenta anos depois, o Sesc Pinheiros abriga a Expoprojeção 1973-2013, de 23 de outubro de 2013 a 12 de janeiro de 2014, com o resgate de quase metade das obras que foram apresentadas ao público na primeira edição, além de produções inéditas. A abertura se deu em 22 de outubro com palestra da curadora do Museu de Arte Moderna de Nova York, (MoMA), Barbara London. O encontro teve como tema “MoMA: Um lugar para as novas mídias – exposições e preservação”, promovendo um diálogo íntimo entre a reedição da exposição e as criações recentes. Quem explica é Roberto Moreira S. Cruz, que realizou a curadoria em conjunto com Aracy Amaral. O núcleo de Aracy resgatou as obras de 1973, já o de Roberto trouxe obras de várias gerações de artistas contemporâneos. “A exposição é uma antologia desses 40 anos de produção de filmes e vídeos de artistas no país. Nesse sentido, comporta tanto as obras históricas e já consagradas no contexto contemporâneo da arte brasileira quanto trabalhos de artistas que estão em evidência nos dias de hoje”, diz. “Por isso, temos numa ponta Letícia Parente, Regina Silveira, Eder Santos, por exemplo, e na outra Ricardo Carioba, Cinthia Marcelle e Letícia Ramos, para citarmos apenas alguns nomes.”
A edição de 2013 apresentará títulos restaurados e remasterizados – em super 8 e 16 mm –, de Claudio Tozzi (Grama e Fotograma), Jorge Izar (Treinamento), entre eles. Também poderão ser vistas remontagens de instalações expressivas, como Conselhos de uma Lagarta, de Regina Vater (1976, filme-instalação) e SPSPSP, de Tadeu Jungle (1990, vídeo-instalação).