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Iniciativas artísticas e culturais na metrópole trazem à tona novas formas de convivência no espaço público


No bairro do Bixiga, em São Paulo, a escadaria antes pouco movimentada aos fins de semana recebe shows mensais de jazz e blues. No elevado Costa e Silva, o Minhocão, cerca de 500 pessoas sentam nas vias para assistir a um espetáculo encenado em uma janela a 5 metros. No metrô, em pleno horário de pico, um grupo declama poesias em um dos vagões. Iniciativas desse tipo têm brotado com frequência na capital paulista nos últimos anos. São saraus nas ruas, karaokês e shows em praças, espetáculos em terminais de ônibus, festas em túneis. Cada uma à sua maneira, trazem à tona um novo modo de relação com o espaço público.


Há quem diga que a cidade nunca foi tão discutida quanto hoje. O coordenador do Grupo de Estudos de Antropologia da Cidade da Universidade de São Paulo (USP), Heitor Frúgoli Junior, considera que a discussão é antiga, mas suas arenas e dinâmicas vêm se modificando. Ele cita a influência de movimentos recentes, como Occupy, Indignados e os protestos de junho de 2013. “O conjunto abrangente de ocupações de espaços públicos em andamento revela um leque muito amplo de significados, redes de relações envolvidas, novas concepções de direitos que se ampliam exponencialmente, usos de tecnologias de comunicação como as redes sociais, novas concepções de liderança e interpelações ou interlocuções com o poder público”, enumera.


O movimento, analisa o sociólogo Tiaraju D’Andrea, é motivado pela noção de direito à cidade. “É uma resposta à tendência dos anos 1990 de privatização do espaço, de exclusividade e de uma cidade para poucos”, esclarece. “Hoje muitas vozes se levantam para propor cidades mais humanas. Juntamente aos movimentos sociais, coletivos artísticos têm-se mobilizado, pautando essa questão.”
Para o coletivo Poetas Ambulantes, que declama e distribui poemas em ônibus e metrôs da capital, a poesia é um instrumento de posicionamento político. “A cidade nos oprime com suas desigualdades, seu concreto e a frieza das pessoas. Queremos colocar cor e esquentar corações com poesia”, explica Jefferson Santana, um dos organizadores. “Isso com certeza é um ato político, pois ajuda as pessoas a se conscientizarem sobre a realidade em que vivem, já que falamos de vários temas nos versos que soltamos para elas.”
O transporte coletivo foi também escolhido por outro grupo, a Cia. Sansacroma, como cenário para incentivar reflexões.


Criado em 2012, o espetáculo de dança contemporânea Outras Portas, Outras Pontes já foi apresentado nos terminais Capelinha, Campo Limpo, Pirituba, Cidade Tiradentes e Parque Dom Pedro. A ideia, como define a diretora, Gal Martins, é “rasgar o espaço”, ou seja, criar outro ambiente naquele local. As reações são as mais diversas – desde pessoas que agradecem até outras que reclamam. “É uma maneira de provocar um contato inesperado com a linguagem de dança contemporânea. Os terminais possuem relação com a opressão, a normatização da condição precária de ir e vir, e o espetáculo trata disso”, comenta a diretora.


Do centro à periferia


Outro ponto que chama a atenção nessas iniciativas é o rompimento de barreiras culturais e sociais. Um exemplo são as festas a céu aberto que ocorrem no centro de São Paulo. Realizadas sem periodicidade definida por coletivos como Voodoohop, Metanol FM, Venga Venga e Carlos Capslock, acontecem gratuitamente, com divulgação pelas redes sociais e ocupando espaços abertos como o Largo do Café, Vale do Anhangabaú e o túnel da praça Roosevelt.


O debate sobre como a vida na madrugada pode regenerar o tecido urbano cresceu a ponto de virar livro. Lançado pela prefeitura em conjunto com artistas, arquitetos e urbanistas no ano passado, o Manifesto da Noite – Em Busca de uma Cidadania 24h estabelece alguns princípios, como: conciliar o “direito à cidade” com o “direito à noite”, garantir a segurança pública sem toque de recolher, regular a noite com o cuidado de preservar seu caráter transgressivo e garantir a continuidade entre o centro e a periferia, evitando uma uniformização.


A periferia, como lembra Tiaraju, tem um papel importante na ocupação urbana com arte e cultura. O sociólogo explica que os bairros periféricos, historicamente menos atendidos pelo poder público, começaram a potencializar suas atividades artísticas e culturais por conta própria – muitas vezes tendo que recorrer a espaços públicos ou ociosos como sede. Entre as motivações, está a mesma busca que impulsiona iniciativas em diversas regiões da cidade: melhorar as condições do local onde se vive. “Esta profusão de atividades artísticas foi uma forma de a periferia tentar, ela mesma, resolver seus problemas”, resume. “É uma espécie de ‘é nóis por nóis’.”


Espaço de todos

Conheça uma série de iniciativas artísticas e culturais que promovem a integração da população com o meio urbano


A Batata Precisa de Você
Formado por moradores e frequentadores do Largo da Batata, o projeto faz ações regulares de ocupação desde janeiro de 2014. Às sextas-feiras ocorrem atividades como conversas sobre a memória do local, construção de bancos para a praça, jogos de rua, oficinas de bike, de jardinagem, de fotografia, saraus, intervenções artísticas e atrações musicais.

Escadaria do Jazz
Evento mensal dedicado ao jazz e ao blues que utiliza como palco um dos ícones do bairro do Bixiga: a escadaria que liga a Rua 13 de maio e a dos Ingleses. Surgiu em novembro de 2014 e acontece todo segundo sábado do mês, reunindo até 700 pessoas por edição.

Poetas Ambulantes
Criado em 2012, é formado por seis integrantes de diversas áreas que possuem em comum o gosto pela poesia. A cada mês, traçam um itinerário diferente pelo transporte público, onde declamam e entregam poemas autorais ou escritos por poetas consagrados.

Karaokê na praça
Acontece mensalmente desde dezembro de 2013 e já passou pela Praça do Pôr do Sol, Largo da Batata, Minhocão, Rua Bom Pastor, no Ipiranga e Largo São Francisco. Desde novembro de 2014, acontece na praça Ana Maria Poppovic, na zona oeste.

Blocos de carnaval
O carnaval se tornou um ícone da ocupação das ruas de São Paulo. Neste ano, mais de 300 organizações inscreveram blocos na prefeitura para desfilar. Segundo a Secretaria de Turismo de São Paulo, o público chegou a cerca de 1,5 milhão de pessoas. 

Projeto Praga
Entre as ações do projeto está o Sarau da Praga, atividade itinerante que ocorre pelo menos uma vez por mês em diferentes espaços da cidade, como praças, terminais de ônibus e outros locais onde a poesia existe, mas passa despercebida.

Slam do 13
Um slam é uma competição entre poetas com textos autorais. O Slam do 13 surgiu há dois anos, com o objetivo de levar as batalhas de poesia para a zona sul de São Paulo. As edições mensais ocorrem no Terminal Santo Amaro.

Slam da  Guilhermina
Acontece toda última sexta-feira de cada mês ao lado do metrô Guilhermina-Esperança. Para competir é necessário trazer três textos autorais. O vencedor da noite ganha livros, CDs e DVDs.

Outras Portas, Outras Pontes
Criado em comemoração aos 10 anos da Cia. Sansacroma e aos 100 anos do Capão Redondo, o espetáculo de dança contemporânea, apresentado em terminais de ônibus,  trata do apartheid social e a opressão, revelando traços da história do bairro e abordando elementos das culturas africana e nordestina.

Pagode da 27
Fundado em 2005 no bairro do Grajaú, acontece aos domingos e reúne amantes do samba autêntico, abrindo espaço para novos músicos e compositores. Hoje o Pagode da 27 conta com 11 músicos e cerca de 20 compositores. 


Nas ruas

Atividades levam música, teatro e outras artes para diferentes regiões da capital

Virada Cultural
Nos dias 20 e 21 de junho, o Sesc participa da Virada Cultural em parceria com a prefeitura de São Paulo. Criada para refletir o espírito da cidade, a Virada oferece, durante 24 horas, atrações culturais para pessoas de todas as faixas etárias, classes sociais, gostos e tribos. Veja a programação no Em Cartaz.

Sesc Música no Mercado
As apresentações, realizadas pelo Sesc Carmo, trazem repertórios variados em diálogo com a tradição musical da região do Mercado Municipal. Em junho, Wilson Dias apresenta o show do disco Lume (18/6, 13h, na praça de alimentação do Mercadão).

Arte no Glicério
Realizado também pelo Sesc Carmo desde agosto de 2012, o projeto promove vivências culturais e atividades de artes visuais, cênicas, circenses e literárias voltadas para os moradores do Glicério, valorizando o espaço público do bairro.

Sou Hip Hop
Programação especial do Sesc Campo Limpo com vivências, intervenções, espetáculos, entre outras atividades que abordam as quatro vertentes do hip hop: break, grafite, DJ e rap.

Cidade Proibida
Realizado pelo Sesc Consolação, o espetáculo da Cia. Rústica esteve em cartaz em maio. Apresentado na Praça do Patriarca, reuniu números que partiam da temática da cidade como lugar de experiência sensível, memória e redes de relações.

Pauliceia Sonora
Organizado mensalmente pelo Sesc Carmo no Coreto da Bovespa, na Praça Antônio Prado, apresenta desde sonoridades tradicionais até o experimentalismo. Em junho, a programação traz a Banda Aromatickos (3/6, 12h30).



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